31 de outubro de 2014

É SÓ FUMAÇA. O Ministro dos Negócios Estrangeiros revelou que há jihadistas portugueses que pretendem regressar à pátria, e que isso, a suceder, será um problema que não sabe como resolver. Por razões que já referi, e que cinco minutos de Google bastarão para explicar, não morro de amores pelo ministro. Mas a dúvida de Machete parece-me razoável, e só a politiquice explica tanta celeuma. A eurodeputada Ana Gomes apressou-se a dizer que os jihadistas «têm de ser tratados como terroristas», julgados por actos de terrorismo nos países de origem. E como? Como vai a justiça portuguesa saber dos crimes eventualmente cometidos na Síria ou no Iraque? Vai lá investigar? E como vai saber que os jihadistas, reais ou hipotéticos, integram (ou integravam) o Estado Islâmico? Deitar-se-ão a adivinhar, ou ficar-se-ão pelo palpite? Mais que as dúvidas do ministro, que talvez deveria guardar para si, gostaria de saber como se fará, na prática, o que defende Ana Gomes. Como já não se ouve falar no assunto, desconfio que foi só fumaça.

24 de outubro de 2014

ARGUMENTOS DESPROPORCIONAIS. Já disse e repeti o que penso do conflito israelo-palestiniano. Mas há uma coisa que me tira do sério: acusar Israel de responder aos seus inimigos «de forma desproporcional», como ainda ouvi esta semana. Alguém explica por que se deve responder de forma proporcional? E o que será, já agora, responder de forma proporcional? À pedrada se se for apedrejado, e com o mesmo número de pedras? Nunca vi argumento mais tão sem pés, nem cabeça. Num conflito, valem as razões que cada um diz ter para atacar ou defender-se. Quem lhe escasseia os meios não tem, como pretende a «tese» da desproporcionalidade, mais razão que o outro, nem retira ao outro legitimidade para os usar.

23 de outubro de 2014

OU HÁ MORALIDADE, OU COMEM TODOS. O presidente da República e o primeiro-ministro enganaram os investidores do Banco Espírito Santo (BES), assegura Daniel Oliveira. Porque ambos conheciam a real situação do BES, e aconselharam outra. Não conheço as declarações dos governantes, mas acredito que o Daniel saiba do que fala. Assim sendo, é grave? Com certeza que é grave. E mentir aos portugueses sobre variadíssimas matérias sobre as quais também sabem, à partida, estar a mentir? Não será igualmente grave, talvez ainda mais grave? Mentir aos accionistas de determinado banco, que de antemão sabem os riscos que correm, é mais grave que mentir aos eleitores? Na opinião do Daniel Oliveira (e doutros mais), é mais grave. Não vou repetir o que já disse por duas ou três vezes. Se os accionistas lesados pelas mentiras dos governantes têm direito a ser ressarcidos, então a generalidade dos cidadãos também tem. Parece-me que isto chega e sobeja para demonstrar o absurdo da teoria.

22 de outubro de 2014

INCOMPATIBILIDADES. Para usar uma expressão que detesto mas muito em voga, os episódios à volta do universo Espírito Santo são, para os comentadores políticos, incontornáveis. O assunto tornou-se obrigatório para quem comenta a actualidade, e tudo indica que por muito mais tempo. Como já se viu, Miguel Sousa Tavares não tem condições para se pronunciar sobre o caso (é compadre de Ricardo Salgado) com um mínimo de isenção. Marcelo Rebelo de Sousa é amigo do banqueiro agora em desgraça, e está tudo dito. Haverá outros, mas estes são, seguramente, os mais influentes. Nada contra Miguel Sousa Tavares ou Marcelo Rebelo de Sousa, mas é preciso que isto se diga — e repita — as vezes que for preciso. A ver se alguém decide o óbvio.

15 de outubro de 2014

COLHEITA DAS VINDIMAS.


Além de meia dúzia de garrafas de origem certificada e proveniência segura, e da gastronomia capaz de ressuscitar um moribundo, nos primeiros dias do santíssimo descanso dediquei-me à colheita de Viagem a Itália, de Goethe, Através do Continente Negro (Volumes I e II), de Henry Morton Stanley, O Homem sem Qualidades (Volumes II e III), de Robert Musil, Enviado Especial, de Evelyn Waugh, O Doutor Glas, de Hjalmar Soderberg, As Maçãs Douradas, de Eudora Welty, e Vidas Perdidas, de Nelson Algren — todos encomendados com prudente antecedência, e prudentemente guardados em local seguro. Depois foram A Estrada do Tabaco, de Erskine Caldwell, A História Não Acabou, de Claudio Magris, Arquivos do Norte, de Marguerite Yourcenar, Novelas e Textos Para Nada, de Samuel Beckett, O Caminho de San Giovanni, de Italo Calvino, Portugal, Ensaios de História e de Política, de Vasco Pulido Valente, A Travessia, de Cormac McCarthy, Arte de Amar, de Ovídio, Sonhos de Bunker Hill, de John Fante, O Mundo de Ontem, de Stefan Zweig, Sapho, de Alphonse Daudet, A Consciência de Zeno, de Ítalo Svevo, O Ente Querido, de Evelyn Waugh, A Divina Comédia, de Dante (oferta do meu sobrinho), Confissões de Uma Liberal, de Maria Filomena Mónica (que comprei sem saber que já tinha), e Pan, de Knut Hamsun (que voltei a comprar pelo mesmo motivo). O pior é o espaço para os acomodar, cada vez mais escasso. Já faltou mais para começar a pô-los debaixo da cama.
REGRESSO ANUNCIADO. Andei afastado das notícias nas últimas três semanas, demasiado tempo para quem vive delas. Regresso com a impressão de me ter escapado algo importante, mas talvez seja apenas um sentimento de culpa. Dediquei os últimos dias a ler incontáveis publicações atrasadas, na esperança de recuperar o tempo perdido. Terei ficado melhor informado, mas a sensação permanece.