23 de fevereiro de 2006

Como as pessoas entenderam mal as suas palavras e lhe terão atribuído declarações «com base em afirmações truncadas», o ministro dos Negócios Estrangeiros resolveu publicar uma carta no Público para esclarecer melhor a trapalhada à volta dos cartoons. E que diz Freitas do Amaral sobre tão delicada matéria? Diz que a liberdade de expressão «tem limites legais e deve ser usada com bom senso»; que pretendeu apelar ao bom senso e não «contribuir para a escalada do conflito» com «mais achas para a fogueira»; que a guerra do Iraque foi, para os muçulmanos, «uma ofensa do Ocidente aos povos islâmicos»; e que o tão glosado campeonato de futebol entre árabes e europeus mais não foi do que uma parcela de um vasto pacote de medidas com vista à promoção do diálogo entre as partes, de que também faziam parte «encontros de professores e cientistas dos dois lados, de escritores e artistas, de historiadores, de teólogos, de empresários e sindicalistas, de comerciantes, de jovens» e sabe-se lá que mais. Ora, para começar, salta à vista que não compete ao ministro contestar os «limites legais» da liberdade de expressão mas aos tribunais, e não consta que tenha havido alguma queixa. Depois, que bom senso é esse que condena quem faz as caricaturas e esquece quem a elas reage matando e incendiando? Não será isso deitar ainda mais achas para a fogueira? Finalmente, que dados tem Freitas do Amaral que lhe permitam concluir que os muçulmanos — todos os muçulmanos — foram contra a invasão do Iraque? Razão têm os que resumiram a posição do ministro dos Negócios Estrangeiros ao episódio do futebol entre árabes e europeus, pois ele ilustra bem a ligeireza (para não dizer leviandade) com que Freitas do Amaral geriu o assunto desde a primeira hora e a forma como, agora, com a publicação do esclarecimento onde nos passa um atestado de estúpidos (ou de mal-intencionados, ou as duas coisas), pretende encerrar o assunto.