16 de janeiro de 2013

MASSACRES EM ANGOLA. João Brandão Ferreira deu à estampa, no Público, uma prosa indignadíssima sobre uma peça publicada naquele mesmo jornal onde foi dito, citando um relatório de um militar português, que o Exército português participou numa «acção punitiva» em Angola de que resultaram «terroristas» decapitados. Segundo o sujeito, que se intitula «oficial piloto-aviador e português com vergonha na cara», a tropa portuguesa teve motivos, que depois passou a explicar. Acontece que Brandão Ferreira afirma a determinado ponto: «Não tenho qualquer dúvida que o relatório aludido é verdadeiro e que o caso relatado não foi o único que ocorreu.» Vai mais longe: «Não foi a única vez que se cortaram cabeças aos bandidos que nos retalharam a carne e os haveres», e no caso que tanto o indignou até diz que «se justificou». Ora, João Brandão acha que o relatório não devia ser notícia? O facto de a «corja de assassinos» (como ele designa as vítimas da «acção punitiva») terem feito mil vezes pior aos nossos justifica que também o façamos a eles? Ou apenas sugere que se escondam estas vergonhas? Fui ler o artigo que tanto o incomodou e não vi, ao contrário do que sugeriu, a opinião das «moças jornalistas» a fazerem-se «de virgens ofendidas». Se li bem, as jornalistas limitaram-se a transcrever o documento e a citar, a propósito, variadíssimas fontes, que tiveram o cuidado de isolar (e contextualizar) o incidente, tornando-o, eventualmente, menos chocante. Ao contrário do que diz, a peça do Público foi oportuna, e o jornalismo a que torce o nariz só peca por não fazer mais coisas destas. Se «todas as guerras acarretam actos de violência gratuita e inumana», como afirma, por que não admiti-los? Brandão Ferreira chama a isto um exercício de autoflagelação «sem motivo para tal», característica, segundo ele, do povo mais masoquista que conhece. Eu chamar-lhe-ia enfrentar as coisas tal como são, não como gostaríamos que fossem. Por mais que se revelem verdades que nos envergonham, que todos sabemos existir.