26 de outubro de 2016

TAPAR O NARIZ E FAZER A CRUZINHA. Se nada mudar até lá, em Novembro votarei Hillary Clinton, porque Donald Trump está fora de questão. Devo dizer, no entanto, que o farei contrariado, e não acredito que Hillary ponha em prática uma só medida que Bernie Sanders lhe terá imposto em troca do seu apoio. Duplicar o salário mínimo? Medicare aos 55 em vez de 65? Legalização da marijuana em todos os estados? Demagogia, demagogia, demagogia. Isto para já não falar das trapalhadas em que se meteu, e quando digo trapalhadas, desvalorizo muitíssimo. Talvez eu seja pobre a pedir (e escandalize muita gente), mas se Hillary conseguir manter as coisas como estão, já não é pouco.

14 de outubro de 2016

TRÂNSFUGAS. Se Donald Trump é tão mau como muitos republicanos o pintam (e eu nunca duvidei que é), por que não votam eles na candidata do Partido Democrático? A pergunta pode parecer absurda (os fanáticos acharão sempre que os seus são melhores que os outros mesmo quando tudo indica o contrário), mas ainda me parece mais absurdo votar num candidato mau só porque é «dos nossos». Quem põe o país acima da paróquia, só pode, a meu ver, pensar deste modo. Hillary Clinton tem todos os defeitos que quiserem. Pessoalmente, acho que tem muitos. Mas comparada com Trump, até os defeitos são virtudes. A recente descolagem da candidatura de Trump por parte de algumas figuras proeminentes do Partido Republicano, por causa da «conversa de caserna», peca por tardia. Descobriram agora que o sujeito não serve? Tratando-se de quem se trata, isto é, de gente experimentada na política, não se pode dizer que tenham andado distraídos. Restam, portanto, duas hipóteses: ou aproveitaram a ocasião para se desvincularem de uma derrota anunciada, e nesse caso moveu-os o puro instinto de sobrevivência política; ou ganharam, de repente, vergonha na cara, e nesse caso não se percebe por que demoraram tanto.

2 de outubro de 2016

A EUTANÁSIA E A FALTA DE SERIEDADE. A discussão sobre a hipotética legalização da chamada morte assistida (ou eutanásia) mal começou e logo se puseram aos gritos. Gonçalo Portocarrero de Almada, sacerdote católico, escreveu que a eutanásia não se distingue de um homicídio, e que pouco se diferencia da que foi praticada pelos nazis. Vasco Pinto de Magalhães, padre jesuíta, caracterizou os que pretendem pôr termo à vida por tal método como «suicidas obsessivos». Laurinda Alves, jornalista, afirmou, de modo ofensivo, que os defensores de tal prática pretendem empurrar os desesperados que querem atirar-se de uma ponte em vez de procurar impedi-los. Anteontem, José Maria Seabra Duque, subscritor de uma petição contra a legalização da morte assistida, escreveu, no Público, que os defensores da ideia pretendem a «legalização do homicídio». Como é óbvio, as questões que envolvem a morte assistida são mais vastas do que estes senhores nos querem impingir. Não é preciso torturar os miolos para constatar que há fortíssimas razões de quem defende tal prática e fortíssimas razões de quem a rejeita — que devem, umas e outras, ser discutidas com seriedade, respeitando a ideia do outro. Não tenho uma posição definitiva sobre este assunto, mas à medida que vou conhecendo o argumentário de um lado e do outro, sou, tendencialmente, a favor da morte assistida. Mesmo que os cuidados paliativos melhorem substancialmente, como todos defendem e desejam. A minha dúvida não está no princípio, mas na prática e suas variantes — que mudam de país para país, e nalguns casos me deixam dúvidas. Dada a complexidade do assunto, não espero que do debate em curso na sociedade portuguesa se conclua o que quer que seja. Mas espero que seja esclarecedor, de modo a que cada um possa, por si só, concluir o que muito bem achar. E é preciso dizer — talvez sublinhar — que ninguém será obrigado a recorrer à eutanásia caso ela venha a ser legalizada, como alguns mentirosos insinuam. «O Estado deve promover a morte dos cidadãos que queiram pôr termo à sua vida?», pergunta Seabra Duque. Como é óbvio, legalizar a morte assistida não significa promovê-la. O jurista está, portanto, a confundir, deliberadamente, quem está pouco informado, talvez porque lhe faltem argumentos melhores. Como não bastasse, ainda tem o descaramento de dizer que «os portugueses merecem um debate sério». Como se tivesse autoridade para tanto.