27 de junho de 2014

BALANÇO DEFINITIVAMENTE PROVISÓRIO. Seguramente que já se fizeram, à hora a que escrevo, todos os balanços, oficiais e não oficiais, sobre o desempenho da selecção no Mundial do Brasil. Olhados por alto, há, para já, um bode expiatório mais ou menos consensual, e que vem mesmo a calhar: Jorge Mendes, o empresário de meio mundo que conta no mundo da bola. É previsível que nas próximas horas aparecem alguns mais, e daqui a uma semana talvez cheguem à meia dúzia. Porque é urgente arranjar bodes expiatórios em quem possamos descarregar as frustrações por não termos conseguido o que os «especialistas» (com aspas e sem aspas) e «quase todo o mundo» (com aspas e sem aspas) nos convenceram estar ao nosso alcance. Nada contra a ideia de que Jorge Mendes, ao que parece «proprietário» de quase toda a selecção, treinador incluído, é um dos responsáveis pelo alegado desastre, que se virmos bem se calhar nem é tanto assim. Mas nesse caso teremos que olhar também para os sucessos que os futebolistas de Mendes alcançam nos clubes onde jogam e nalgumas selecções ainda a competir, onde pontificam alguns dos «seus» jogadores. Sim, porque se ele é culpado quando as coisas correm mal, também terá algum mérito quando as coisas correm bem. Longe de mim ser um desmancha-prazeres, mas se há coisas que não aprecio é histórias mal contadas, juízos precipitados, bodes expiatórios para acudir às frustrações imediatas. Cá para mim, a nossa maior tragédia na bola é não sermos realistas, não admitirmos que há outros melhores do que nós. Como é evidente, ter o melhor jogador do mundo não basta para termos a melhor selecção do mundo. Sonhar é óptimo quando os sonhos resultam agradáveis. Mas chocar de frente com a realidade também tem as suas virtudes.

24 de junho de 2014

SOMOS OS MAIORES, NÃO ÉRAMOS? Não será preciso lembrar que os que ainda ontem colocavam a selecção nos píncaros são os mesmos que agora, conhecida a hecatombe frente à Alemanha e o medíocre desempenho frente aos EUA, a crucificam sem dó, nem piedade. Mas também é preciso lembrar outra evidência: as expectativas à volta da selecção foram criadas, essencialmente, pelos media, sobretudo pelas televisões. Na ânsia de audiências, fizeram directos a toda a hora para ouvir os palpites dos transeuntes e dos vendedores de pirolitos, foram subindo a fasquia de dia para dia até atingir níveis impensáveis, e quando um ou outro desmancha-prazeres aconselhou prudência e caldos de galinha, fizeram ouvidos de mercador. Se tudo corresse bem, nada haveria a dizer. Como correu mal, começou a caça aos culpados, reais e inventados, que o assunto também rende. De uma coisa, porém, podem estar certos: os media sairão isentos de culpas, pois se alguém lhas apontar, dirão que se limitaram a fazer o que deviam. É por estas e por outras que assino por baixo o que disse Estrela Serrano.

20 de junho de 2014

OS SRS. DEPUTADOS PERDERAM A VERGONHA. Afinal, os srs. deputados, incluindo os que sustentam o actual governo (PSD e CDS), nunca tiveram dúvidas acerca da decisão do Tribunal Constitucional (TC) que repõe os cortes salariais impostos pelo Governo, apesar de solicitarem uma aclaração ao mesmíssimo TC sobre o mesmíssimo assunto. Segundo o Expresso, mal foi conhecida a decisão do TC, os deputados trataram logo de agir, isto é, de repor os seus próprios salários auferidos antes da decisão governamental. «No mesmo dia em que os deputados da maioria falavam grosso ao TC», diz o Expresso, «(...) o mesmo PSD e CDS davam luz verde a que o Parlamento repusesse de imediato (...) os salários dos deputados e dos funcionários parlamentares.» Assim ficou demonstrado que os srs. deputados não precisam de aclarações quando estão em causa os superiores interesses deles próprios. A única coisa de que talvez precisem é de vergonha na cara.
UM PAÍS EXTRAORDINÁRIO. O extraordinário não é Mota Pinto renunciar a todos os cargos políticos caso assuma a presidência do Conselho de Administração do BES. O extraordinário é isto ser notícia.
COISAS QUE VOU LENDO (11). «Dialética é um dizer que não, outro, que sim, e no fim ganhar aquele que for mais importante na firma. É um conceito antigo, eu ia dizer que remonta a Sócrates não fosse o receio de que o Correio da Manhã aproveite e faça manchete: "Sócrates roubou a dialética ao grego Zenão de Eleia!» Ferreira Fernandes, DN de 20/6/2014

17 de junho de 2014

ODIAR A FIFA PARA ESCONDER O RESTO. A FIFA tem todos os defeitos que lhe apontam, e provavelmente alguns mais que não sabemos. Mas daí até dizer-se que as regras que impôs ao Brasil para organizar o Mundial em curso «consagra zonas de não aplicação da lei nacional em anéis de dois quilómetros em volta dos estádios, onde vigora um rigoroso monopólio (...) dos patrocinadores oficiais», que «beneficiarão de isenção total de impostos», como escreveu José Manuel Pureza, e responsabilizar a FIFA por estas barbaridades, vai um abismo. Que se saiba, o governo brasileiro candidatou-se a organizar o evento, e para o conseguir teve de preencher determinados requisitos e de se comprometer com determinado caderno de encargos. Se há regras impostas pela FIFA que são autênticas barbaridades (não duvido que haja), seguramente que a culpa não é do organismo que superintende o futebol mundial, por mais ódio que se lhe tenha. Como é óbvio, a culpa é do governo que se candidatou à organização do Mundial, e do Governo actualmente em funções — que podia, em última instância, desistir de organizá-lo. Chamando os bois pelos nomes, a culpa foi de Lula da Silva, e depois de Dilma Rousseff. Porque foram eles, e só eles, que aceitaram as condições de que meio mundo agora se queixa, especialmente os que tentam, por omissão, branquear as decisões dos que são, afinal, os primeiros responsáveis.

13 de junho de 2014

INCOMPETÊNCIAS E TRAPALHADAS. Palavra de honra que eu gostava de saber quanto vão custar aos contribuintes as sucessivas trapalhadas com o leilão dos «Mirós», de que o Estado, através de empresas especialmente criadas para o efeito, se propôs vender para recuperar algum (dizem-me que 35 milhões de euros) do que meteu no banco de Oliveira e Costa e sus muchachos. É que, por este andar, a receita da eventual venda das 85 obras do pintor catalão vai inteirinha para os advogados que trabalham nas trapalhadas jurídicas em curso e no mais que há-de vir. Vendo bem, se calhar nem para isso dará, que em trapalhadas já demonstrámos vezes sem conta que são umas atrás das outras — e isso, naturalmente, tem custos. Isto partindo do princípio que é de trapalhadas que se trata, e quando digo trapalhadas quero dizer, apenas, incompetência. Incompetência, já agora, que dá de comer a muita gente, e para não variar paga pelos mesmos de sempre.

11 de junho de 2014

NOTÍCIAS DE TRAMPA. Bruno de Carvalho chegou há dois dias ao dirigismo desportivo como uma espécie de salvador da moral e bons costumes, mas cada vez que abre a boca (e deus sabe que é raro o dia que não abre), é um fedor que tresanda. O futebol profissional é um mundo de aldrabões e de vigaristas. É frequentado por gente que não se recomenda. Cheira mal, muito mal. Excepto quando envolve a sua excelentíssima pessoa e seus finíssimos métodos, está bom de ver. Valha-nos que o Sporting, apesar de fraquito de bola nos últimos anos, não deixa de ser uma instituição respeitável mesmo quando dirigido por moralistas de vão de escada e justiceiros de taberna, que de moral e justiça só enxergam o que lhes convém — e a caca que eles próprios produzem.

9 de junho de 2014

CONCLUSÕES PRECIPITADAS. Miguel Sousa Tavares afirmou, no Expresso, que os dois terços dos portugueses que não votaram nas Europeias contribuíram, com a ausência das urnas, para que os extremistas «tenham ganho uma força acrescida face ao voto dos outros». É um cenário possível, mas não único. Quem lhe garante que os abstencionistas votariam, caso fossem às urnas, nos partidos, digamos, «do sistema», e não reforçariam ainda mais os extremistas? Decidir não ir as urnas é, de certa maneira, um protesto. Resta, portanto, saber até onde os abstencionistas iriam caso protestassem nas urnas.

5 de junho de 2014

TRUQUES ORTOGRÁFICOS. Comentando para o Observador os erros ortográficos detectados em cartazes de pelo menos duas empresas (a Olá e a Imaginarium), a linguista Susana Valdez sugeriu um truque para evitar o que considera «um dos erros gramaticais mais comuns em português»: «colocar a frase na negativa», por razões que explicou mas não entendi. Como de língua pouco mais sei que o essencial, se calhar nem isso, recomendaria um truque mais simples: usar um corrector ortográfico decente. Se não resultar, então é usar um que nunca falha: aprender gramática.
OS ERROS DA OLÁ. Quem nunca pecou que atire a primeira pedra, mas a campanha em curso (no Facebook, onde haveria de ser?) contra os gelados Olá (parece que já há outra empresa), por ter distribuído uns cartazes com erros ortográficos, devia dar origem a outra, ainda mais veemente, contra os erros ortográficos na generalidade da imprensa (sobretudo nas suas versões online) e na legendagem das televisões. Não falo de gralhas, que por vezes se confundem com erros ortográficos. Falo de verdadeiros erros de ortografia, alguns de palmatória, que no meu tempo de instruçāo primária me dariam, na melhor das hipóteses, o direito a escrever cada um deles umas dezenas de vezes.
A EMBRULHADA. Consta que Winston Churchill, que qualquer aprendiz de político gosta de citar, terá dito mais ou menos isto: «Por mais absorto que um general esteja na elaboração das suas estratégias, às vezes é importante ter o inimigo em consideração.» (A citação foi roubada do livro Conservadorismo, o mais recente de João Pereira Coutinho.) É o que me apetece dizer de António José Seguro, que de tão entretido com o novo brinquedo (as directas, que ainda há pouco não apreciava e ninguém, a começar por ele, sabe como funcionam), não se dá conta no que se meteu. O expediente do líder do PS é mesmo o que parece: destina-se a prolongar-se no poder, e a dificultar a vida aos adversários. Não é bonito de ver, mas quando os actores são maus, não se espera que o filme seja melhor. Ou Seguro não vive neste mundo (já demonstrou várias vezes que não vive) e não percebe que o que está em causa deve ser tratado com clareza e celeridade, ou percebe muito bem e agarra-se a formalismos para se manter no poder. Escusado será dizer que a estratégia penaliza, antes de mais, o PS, e que Seguro sairá mal desta história. Mesmo num (improvável) cenário de se ver confirmado como líder.

4 de junho de 2014

MARINHO DEMAGOGO PINTO. Marinho Pinto ainda agora chegou à política e já lançou mão do que nela há de pior. Mal foi eleito para o Parlamento Europeu (PE), admitiu candidatar-se às Legislativas, e logo a seguir às Presidenciais. Sobre o PE, tudo o que disse até agora é que achava um exagero a mesada dos deputados (parece-me que 10.000 euros), vencimento que promete gastar «da melhor maneira possível». Sim, o ex-bastonário da Ordem dos Advogados é um homem frontal, chama os bois pelos nomes e aparenta nada temer — valores cada vez mais escassos e que naturalmente aprecio. Mas Marinho Pinto também é um populista, um demagogo, um produto criado pelos media para os media, o que já me desagrada. A candidatura ao Parlamento Europeu foi, para ele, uma espécie de teste ao que vale em termos eleitorais. O resto — a Europa, o cargo que irá desempenhar, o que se propõe fazer ou desfazer — não interessa para nada.