30 de julho de 2015

NÓS, OS AFOGADOS. Mais de um ano depois de começar a ler (sou dos que lê vários livros ao mesmo tempo), terminei Nós, Os Afogados, do dinamarquês Carsten Jensen. Como então escrevi após duas centenas de páginas (o livro tem quase 800), é uma obra notável. Cada vez sou mais poupado nos elogios que faço a um livro. Porque me fui tornando mais exigente, porque o entusiasmo pelos livros já viu melhores dias, porque estou a perder qualidades, por outra razão que não estou a ver. Mas hoje, terminadas as últimas páginas, abro mão deles sem reserva ou hesitação. Nós, Os Afogados, é um clássico antes de o ser.
COISAS QUE VOU LENDO (30). «País que não produz bom vinho é como o Alto Volta: não quero nem saber onde fica. Meu planisfério restringe-se a nove países: França, Itália, Espanha, Portugal, Alemanha, Chile, Argentina, Austrália e EUA. Ando com vontade de tirar a Alemanha e a Argentina do mapa. O Brasil é apenas o lugar onde vivo. Não fosse pelo meu Pinot Noir, já teria me mudado para a França - a única superpotência na geopolítica enológica. Estou pouco me lixando para o barril de petróleo a 100 dólares. O diabo é uma garrafa de Mystère-de-la-Toilette a 380 euros.»

24 de julho de 2015

TEORIA DAS INSTALAÇÕES. O brasileiro Juremir Machado da Silva escreveu, no livro Um escritor no fim do mundo, relato de uma viagem à Patagónia na companhia de Michel Houellebecq, o seguinte: «Numa exposição, dessas de arte contemporânea, (...) um artista famoso pendurou num varal uma cueca suja de cocô. A crítica ficou deslumbrada. Boa parte da literatura experimental, na busca desesperada do novo, é cueca com cocô. A novidade é visível. Só que cheira mal.» Não morro de amores por aquilo que genericamente se designam «instalações», mas nada contra. O meu problema com elas é quando as põem ao nível do que a arte tem de melhor. Não conheço, mas haverá uma ou outra em que a equiparação não chocará. Mas serão, quando muito, as tais excepcções que confirmam a regra.

22 de julho de 2015

KRUGMAN E A INCOMPETÊNCIA PRÓPRIA E ALHEIA. De facto, Paul Krugman engana-se muito. Até eu, que de economia e finanças pouco mais sei que nada, nos últimos tempos tenho acertado mais que o Nobel da Economia, desculpem a presunção. A realidade está sempre a desmentir as suas belas teorias (são mais fezadas, mas chamemos-lhe teorias), mas ele não desarma. Até um astrólogo já teria consultado os astros e corrigido a pontaria.

17 de julho de 2015

DIZER SEM DIZER. Já repararam que sempre que se diz mal do ministro alemão das Finanças, nos jornais ou nas redes sociais, ele aparece na fotografia em cadeira de rodas? Não, não me venham dizer que eu defendo que se deva esconder a sua deficiência, muito menos que o caso dele se compara à novela em cena (a esposa do primeiro-ministro português apareceu no Correio da Manhã sem cabelo após ter feito quimioterapia e logo originou uma pequena polémica). A exibição de Wolfgang Schäuble na cadeira de rodas não engana ninguém: ela pretende dizer, sem dizer, que o todo-poderoso ministro não passa, afinal, de um deficiente. Que a deficência seja apenas física, não importa para o caso. O que importa é passar a ideia de que Schäuble é um deficiente, logo age como tal.

16 de julho de 2015

CENSURA NA TVI? Face às variadíssimas acusações que Augusto Santos Silva tem vindo a fazer, ainda não vi, devo dizer que estranhamente, qualquer explicação da TVI para o seu afastamento, e neste momento até me parece que, a haver, já vem tarde. Com certeza que as televisões têm o direito de mudar os colaboradores quando assim o desejarem. Por razões editoriais, comerciais, ou outras. Convém é que em casos destes, que envolve um destacado militante do PS e destacadíssimo apoiante do seu líder (mas podia ser doutro partido e outro líder qualquer), se expliquem os motivos do seu afastamento, de modo a não parecer o que efectivamente parece.

9 de julho de 2015

QUANDO O ÓBVIO SE TORNA SURPREENDENTE. Guy Verhofstadt, ex-primeiro-ministro belga e actual líder do grupo liberal no Parlamento Europeu, resolveu dizer duas ou três verdades ao primeiro-ministro grego e tornou-se, de repente, um herói. Bem sei que andamos com falta de heróis (é ver como de uma hora para a outra se transforma em herói alguém que se limitou a cumprir o seu dever), mas custa a crer que só agora, meio ano depois de a Grécia jogar ao rato e ao gato com as «instituições», alguém tenha dito o óbvio, e que o óbvio se tenha tornado uma coisa extraordinária. Os entusiastas do Syriza descobriram, logo depois, com indisfarçável euforia, que Verhofstadt também terá cometido não sei que pecadilhos. Ora, a ser verdade, isso muda o quê? Passou a ser mentira o que Verhofstadt disse no Parlamento sobre Tsipras e o seu Governo?