29 de dezembro de 2005

O candidato à Presidência da República pelo Bloco de Esquerda, que hoje criticou a proposta do Governo que prevê um aumento de 1,5 por cento dos salários da Função Pública, acha que o Presidente da República deve opinar «sobre questões de fundo». Também Manuel Alegre e Jerónimo de Sousa criticaram o aumento proposto pelo Governo de José Sócrates, dizendo o primeiro que contava com um aumento «um bocadinho» superior e o segundo que a proposta do Governo é «inaceitável». Ora, não será isto uma intromissão inaceitável na esfera de competências do Governo? Desculpem a insistência, mas é que isto de só alguns candidatos terem o direito de opinar sobre política governamental sem que isso seja entendido como uma intromissão nos assuntos da governação traz água no bico.
O México, ao acaso

28 de dezembro de 2005

Cavaco Silva chamou a atenção para o problema do desemprego. Ora, ainda não vi qualquer reacção dos restantes candidatos, a quem Cavaco instou a fazerem o mesmo. É que a chamada de atenção para o problema do desemprego é uma ingerência na esfera governativa, não é?
Cada vez gosto mais dos bonecos do Contra-Informação, e cada vez gosto menos dos quadros de que são protagonistas. Serei só eu a pensar assim, ou a imaginação por aquelas bandas já viu melhores dias?

27 de dezembro de 2005

Cavaco Silva terá sugerido que o investimento estrangeiro em Portugal devia ser acompanhado por uma Secretaria de Estado especialmente criada para o efeito. Perante isto, Mário Soares veio logo dizer que as declarações do ex-primeiro-ministro são «muito graves», pois significam uma intromissão nas competências do Governo. Ora, quem foi o candidato presidencial que ainda não defendeu (ou atacou) políticas que são da estrita competência do Governo? Além disso, que autoridade moral terá Mário Soares para fazer juízos de intenção sobre um candidato que quando foi primeiro-ministro foi vítima da intromissão sistemática de um Presidente da República chamado Mário Soares? Por último, que mal tem que um candidato à Presidência da República sugira que se crie este ou aquele departamento governamental? Será que os candidatos presidenciais não podem ter opiniões sobre o Governo e a sua constituição? Dizer-se que isto é ingerência na esfera do Governo, só por demagogia ou maldade. Pena que Cavaco Silva não tenha visto a questão dessa maneira em vez de dar o dito por não dito.

23 de dezembro de 2005

Uma última coisa sobre as Presidenciais antes de sucumbir aos álcoois de Natal: diz-se e repete-se que os debates entre os candidatos presidenciais não trazem quaisquer novidades. Ora, será que há quem pense que os candidatos têm alguma novidade que ainda não revelaram por falta de oportunidade?
A secção europeia do Conselho das Comunidades Portuguesas, órgão de consulta do Governo para as questões da emigração, resolveu protestar junto da televisão do Estado pelo facto de nenhum dos seus membros ter participado no «Portugal no Coração» transmitido a partir da Suíça. Ao que parece, os responsáveis pelo programa terão desconvidado um dos conselheiros porque a escolha gerou uma enorme controvérsia entre eles. Ora, como o expediente não fosse embaraçoso que chegasse (a controvérsia não girou à volta de questões substanciais mas de protagonismo), os senhores conselheiros ainda tiveram o desplante de protestar por não terem participado num programa... de entretenimento. Não, não me consta que algum deles cante ou tenha habilidades além das enunciadas.

22 de dezembro de 2005

As mulheres (…) vestem-se tanto melhor quanto mais tencionam despir-se. Rodrigues Miguéis, Uma Aventura Inquietante

21 de dezembro de 2005

Não, não me espanta que a comunicação social tenha dito que Mário Soares foi «contundente» ou «aguerrido» com Cavaco Silva em vez de ter dito que foi arrogante e malcriado. A mim já nada me espanta.
O MacGuffin regressou à blogosfera. Só escreve de vez em quando e diz estar a perder qualidades, mas é uma boa notícia na mesma.

20 de dezembro de 2005

Mário Soares acha que Cavaco Silva não tem formação política, que é incompetente e ignorante em tudo que não seja economia e finanças, que só diz banalidades e que está a tentar enganar os portugueses. Tudo isto dito várias vezes e de várias maneiras, por vezes de forma cruel, chegando a parecer que tinha perdido a cabeça. Fez mais o ex-presidente da República no frente-a-frente com Cavaco Silva na RTP: numa manobra típica de quem está desesperado, o candidato do PS recorreu ao ataque pessoal, tentou fazer um julgamento de carácter do adversário, fez insinuações que foi incapaz de concretizar, foi arrogante e grosseiro até dizer chega e voltou a dizer que tem uma vasta cultura humanista que eu, sinceramente, não sei se tem. Voltou, em resumo, a demonstrar que o grande desígnio da sua candidatura à Presidência da República é derrotar Cavaco Silva, e só derrotar Cavaco Silva. O adversário fez o oposto, e fez bem. Ignorou os ataques (imagino que não deve ter sido fácil), esteve mais sereno (quem diria?), contra-atacou com substância e elegância, chegou a praticar a ironia. Para um candidato que toda a gente dizia não ser um especialista em debates, não se saiu nada mal. Pelo contrário, Mário Soares chegou a ser desastroso. Apontado por todos como um especialista neste tipo de confrontos, duvido que o debate lhe tenha rendido um só voto — se é que não perdeu alguns. Mas só se pode queixar de si próprio, pois optou por uma estratégia que esteve longe de se revelar eficaz. Por demérito próprio mas, também, por mérito alheio. A forma pouco elegante como se comportou neste confronto merece, por si só, que os portugueses lhe dêem uma derrota histórica nas próximas Presidenciais.

19 de dezembro de 2005

Mário Soares está desesperado. Tal como previ há um mês, já só lhe falta fazer o pino. Agora exige (o verbo é esse mesmo) que haja mais debates. E porquê mais debates? Porque os eleitores precisam de mais esclarecimentos, argumenta o candidato. Porque os debates não lhe trouxeram os benefícios que estava à espera, argumento eu. Mas se Mário Soares acha mesmo que os portugueses precisam de mais esclarecimentos, então devia começar por explicar qual é a sua posição face ao famoso «défice democrático» da Madeira em vez de se furtar à questão alegando que pretende «falar do futuro e não do passado». Seguramente que os eleitores iriam ficar muito mais esclarecidos.
I would be wonderful with a 100-year moratorium on literature talk, if you shut down all literature departments, close the book reviews, ban the critics. The readers should be alone with the books, and if anyone dared to say anything about them, they would be shot or imprisoned right on the spot. Yes, shot. A 100-year moratorium on insufferable literary talk.
O Internet Explorer para Mac vai acabar.
Não me lembro se foi a primeira, mas foi das primeiras vezes que vi televisão. Foi num anfiteatro improvisado num barracão, aos domingos à tarde, embora só tenha uma vaga ideia do que via. Lembro-me que ainda a TV era a preto-e-branco, do farnel que a minha mãe me preparava para a ocasião, e pouco mais. O sr. Alberto era o responsável por aquilo, que mais tarde transformaria numa espécie de percursora das casas de jogos electrónicos de hoje. Uma vez «inventou» a electricidade, que passou a fornecer a casa onde vivia. Outra vez inventou uma geringonça para afugentar a passarada das sementeiras. A mais célebre, porém, foi a que meteu «almas do outro mundo. O resto está aqui.

16 de dezembro de 2005

Face às Presidenciais do mês que vem, a maioria dos que me rodeiam não ouve, não vê, não quer saber. Até aqui, nada de extraordinário. O extraordinário começa quando demonstram ideias firmes sobre os candidatos presidenciais, todos os candidatos presidenciais. Sócrates terá dito: «sei que nada sei». Ou seja, o filósofo concluiu que nada sabia face à imensidão do conhecimento. Ora, se assim é, o contrário também deve ser verdade. Isto é, os que menos sabem são os que mais pensam que sabem.
Estou curioso de saber o desfecho do caso em que Paulo Pedroso acusou o Procurador-Geral da República de «violação do dever de imparcialidade». Como disse Garcia Pereira, o mínimo que se pode esperar de Souto Moura é que desminta o ex-deputado e proceda em conformidade. Ou, então, se demita.

15 de dezembro de 2005

Depois de ter sugerido que Israel devia ser «varrido do mapa» ou transferido para a Alemanha ou Áustria, o presidente iraniano sugere, agora, que o Holocausto nunca existiu. Mohammed Ahmadinejad acha que «o massacre dos judeus» (assim mesmo, com aspas) é um «mito». Face a isto, a «comunidade internacional» ficou «indignada», «chocada» e «escandalizada», como ontem ficou «indignada», «chocada» e «escandalizada» quando o presidente iraniano sugeriu que Israel devia ser varrido do mapa ou transferido para a Alemanha ou Áustria, como amanhã ficará «indignada», «chocada» e «escandalizada» se o primata que manda no Irão resolver dizer que os israelitas devem ser postos contra um muro e varridos à metralhadora. Isto é, a «comunidade internacional» anda tão «indignada», tão «chocada» e tão «escandalizada» que não enxerga o óbvio: que é necessário agir antes que seja tarde.

13 de dezembro de 2005

«[Manuel] Alegre parece um diestro atarantado que toureia os cabrestos enquanto o toiro fuma um puro sentado nos médios.» Filipe Nunes, no Mar Salgado

12 de dezembro de 2005

Não vi com grande atenção o debate entre Manuel Alegre e Francisco Louçã, mas deu para perceber uma coisa: se eu não soubesse quem eram os cavalheiros e quem representavam, diria que Louçã era militante do PS e Alegre dirigente do Bloco de Esquerda. Mesmo depois daquela parte em que Alegre foi confrontado com o uso pouco comum da palavra Pátria, que justificou como quem se desculpa e de que Louçã prontamente se demarcou.
O Expresso resolveu gabar a «prontidão e sentido de responsabilidade» de um secretário de Estado por este ter ordenado a transferência dos imigrantes detidos «numa espécie de contentor pré-fabricado» para «locais condignos» após uma reportagem da SIC. Ora, eu não vejo porquê. Afinal, como lembra o próprio Expresso, o contentor onde se encontravam os detidos «já funcionava há mais de dois anos». Ou seja, foi preciso uma reportagem televisiva para o que Governo tomasse conhecimento de um assunto com barbas e que já era do conhecimento público.

9 de dezembro de 2005

Pelo caminho que as coisas estão a levar, ainda bem que não posso ver o debate entre Mário Soares e Manuel Alegre (dia 14, na TVI). Depois de Cavaco Silva, a quem começou por lançar uma farpa dia sim, dia sim, Mário Soares virou-se para o seu «amigo» Manuel Alegre. O ex-presidente da República já percebeu que Manuel Alegre é o alvo a abater, pois todas as sondagens demonstram que o deputado-poeta tem probabilidades de chegar à segunda volta. Apesar de o modelo do frente-a-frente não proporcionar o confronto directo, adivinha-se coisa feia de se ver.
Não nego que o caso dos crucifixos seja um assunto importante, mas eu já me contentava que banissem a «música de Natal» que todos os dias sou obrigado a ouvir.

8 de dezembro de 2005

Uma estopada o debate entre Mário Soares e Jerónimo de Sousa. De facto, o modelo adoptado, pelo menos o modelo adoptado pela RTP (não vi o debate da SIC), não funciona. Não vi o frente-a-frente entre Cavaco Silva e Manuel Alegre, mas fartei-me de ouvir quem o designasse como uma espécie de entrevista aos candidatos. Foi o que me pareceu com Mário Soares e Jerónimo de Sousa, pois debate foi coisa que não houve. Não que fosse desejável que os candidatos se pusessem aos berros, mas porque seria de esperar mais vivacidade e algum confronto de ideias. Talvez tenhamos demasiado presente o debate que opôs Mário Soares a Álvaro Cunhal (uma espécie de modelo a seguir) e estejamos a pedir demais. Quanto aos candidatos, Mário Soares decepcionou. Esteve muito defensivo (quem diria?), pouco interessado em questiúnculas com o adversário. Pelo contrário, Jerónimo de Sousa surpreendeu. Esteve quase sempre ao ataque, foi consistente nas respostas e não se coibiu de dar umas alfinetadas no adversário. Quem ganhou ou quem perdeu é coisa que não me aquece, nem me arrefece.
Admito que a minha visão do debate entre Mário Soares e Jerónimo de Sousa possa causar comichão a algumas pessoas, e certamente que é discutível. Mas a análise que Joana Amaral Dias fez do frente-a-frente Mário Soares/Jerónimo de Sousa é verdadeiramente hilariante.

7 de dezembro de 2005

Marcelo Rebelo de Sousa resolveu apelar ao respeito pelos tribunais, «sobretudo pelos que têm mais responsabilidades». Parece-me bem. Mas ainda me parecia melhor que os tribunais começassem por se respeitar a si próprios. Os tribunais e toda a máquina da justiça, que nos últimos tempos têm dado uma imagem que não merece respeito.

5 de dezembro de 2005

Confesso que nunca entendi bem o entusiasmo à volta da Wikipedia. Que haverá de tão aliciante no facto de um cidadão anónimo poder publicar uma entrada numa enciclopédia que na hora seguinte pode ser modificada por outro cidadão anónimo e depois apagada por outro? Eu sei que não custa nada fazer juízos à posteriori, mas quantos casos haverá como o de John Seigenthaler? Que credibilidade se pode atribuir a uma enciclopédia que qualquer um pode mudar a seu bel-prazer?
Ainda não vi protestos por causa da nova lei antiterrorista aprovada pelos deputados franceses. A lei, recorde-se, prevê o alargamento de quatro para seis dias a duração máxima da custódia judicial de suspeitos em casos «de iminência de uma acção terrorista» e a autorização da vídeo-vigilância nos transportes públicos, imediações das estações ferroviárias e outros locais públicos (estabelecimentos comerciais e lugares de culto, por exemplo). Ora, não será isto um atentado à liberdade dos cidadãos?
Contrariamente aos Lusíadas, de que toda a gente diz bem mas ninguém lê, o Bilhete de Identidade (de Filomena Mónica) é um livro de que toda a gente diz mal mas toda a gente lê. Por que será?

2 de dezembro de 2005

Uma surpresa a entrevista de Cavaco Silva à RTP. O ex-primeiro-ministro mostrou-se sereno, seguro, longe da rigidez a que nos habituámos. Elogiou Sócrates com frontalidade, desmentiu Soares com elegância, demarcou-se da politiquice. Alguma hesitação quanto Judite de Sousa lhe perguntou o que pensava de Jorge Sampaio ter nomeado Santana Lopes como primeiro-ministro, mas acabou por admitir que o Presidente da República não teve alternativa. Do resto, falou-se muito em abstracto, pouco em concreto. Judite de Sousa esteve melhor que nas entrevistas a Manuel Alegre e Mário Soares (não vi a de Francisco Louçã), embora o entrevistado lhe tenha facilitado a vida.

1 de dezembro de 2005

Eu não quero ser um desmancha-prazeres, mas continuo com uma dúvida: teria o ex-vice-presidente da autarquia portuense a postura de que hoje se vangloria caso não tivesse sido afastado da lista do PSD à Câmara do Porto? Pois é, não consigo comover-me quando ele vem dizer que em Portugal se vive «um regime decrépito, que tudo consome e destrói e impede o desenvolvimento», que se vive sob um «regime em tudo igual ao final do [regime] de antes do 25 de Abril». Como já aqui disse, o que me comoveria era que Paulo Morais concretizasse aquilo de que fala. Isto é, que dissesse os nomes de quem o pressionou e com que intenções, de quem cedeu às pressões e o que ganhou com isso. Estarei na primeira fila para o aplaudir no dia em que isso suceder. Até lá, bem podem vir com almoços e jantares de homenagem que eu não me comovo.