31 de agosto de 2007

Vista a entrevista, devo dizer que não aprecio a forma utilizada por Mário Crespo, pelo menos a forma utilizada para entrevistar Gualter Baptista — por quem, devo acrescentar, não nutro a mais leve simpatia. É que aquilo não foi bem uma entrevista, mas um interrogatório. Um interrogatório em que me revejo nos argumentos, mas um interrogatório. E uma entrevista não é — não pode ser — um interrogatório. Pacheco Pereira, que aplaudiu a forma como a entrevista foi conduzida, devia lembrar-se disso. Não podemos aplaudir os métodos quando eles servem os nossos propósitos, e condenar quando não nos convém.
O secretário-geral da Associação Sindical Independente de Agentes da PSP atribuiu aos baixos salários praticados por aquela corporação o eventual envolvimento de agentes daquela polícia em esquemas de segurança privada. Ernesto Rodrigues acha que não haveria a tentação de ganhar uns dinheiros na segurança privada caso «os salários [dos agentes da PSP] fossem decentes», coisa que não acontece por culpa do Governo. Ora, por mais bem-intencionado que seja, o pressuposto do sindicalista é um absurdo inadmissível. É que, a verificar-se esta lógica, qualquer cidadão que não tem um «salário decente» tem o direito de recorrer a expedientes à margem da lei para aumentar os seus rendimentos, e de um agente da lei espera-se tudo — menos que a transgrida. Há, depois, outro problema. O que é um salário decente? Desde quando um salário decente impediu alguém de fazer uns biscates para aumentar a mesada? Não sei se os agentes da PSP são, ou não, mal pagos, mas não me custa acreditar que sim. Mas daí até desculpar o que não tem desculpa, vai um abismo.
Como não está em linha, não resisto a transcrever parte do editorial da Sábado de ontem.
«De tempos a tempos, como aquele adepto do FC Porto, o SIS põe a cabecinha de fora e tenta aparecer na fotografia. Faz sempre má figura. Há dias surgiu um relatório sobre o Ecotopia, o acampamento de onde supostamente saiu o grupo que destruiu um hectare de milho transgénico em Silves. Primeira dúvida: o que faz o SIS à volta do Ecotopia? Um grupo de hippies cometeu um crime, certo, mas convenhamos: não estamos propriamente perante aquilo a que a lei chama "sabotagem, terrorismo, espionagem e prática de actos que, pela sua natureza, possam alterar ou destruir o Estado de direito constitucionalmente estabelecido". Segunda dúvida: tendo o SIS andado à volta do Ecotopia, como é que não percebeu o que ia acontecer?
Os nossos espiões reapareceram pouco depois com declarações sobre a eventual presença da ETA em Portugal. E pelo que se lê percebe-se que as únicas informações que têm são conhecidas de toda a gente que compra jornais.
Convém esclarecer, para não haver confusões com os traumatizados de Guantánamo: o problema não é Portugal ter um serviço de informações; o problema é, como salta à vista, não ter

30 de agosto de 2007

Apesar de a minha conta bancária ter menos zeros à direita do que eu gostaria e de nunca me passar pela cabeça tornar-me accionista, pondero suspender a minha relação com o BCP. Posso estar enganado, mas não deve faltar por aí quem esteja a pensar o mesmo que eu — ou quem já tenha ido mais longe do que eu. É que o circo montado à volta de que manda no BCP excedeu o razoável, e não augura nada de bom. Quando seria de esperar contenção e o máximo de descrição, os cavalheiros desdobram-se em declarações incendiárias aos media. Quando se recomendaria bom senso e um esforço de consenso, cada vez se entrincheiram mais nas razões que dizem ter. Entretanto, a forma como se movimentam indicia que, para eles, os clientes — pelo menos os pequenos clientes — não contam. Assim sendo, é provável que eu deixe de contar com eles.

27 de agosto de 2007

Parece que há uma conspiração à volta do caso Madeleine, diz Moita Flores no Correio da Manhã. Segundo ele, «serviços de contra-informação» comandados pelo «próprio governo inglês» estarão «activamente a trabalhar para destruir a credibilidade de qualquer outra resposta para o caso que não seja a hipótese do rapto». Infelizmente, Moita Flores não entra em detalhes sobre o que designa por «monumental burla», e devia. Devia porque afirmações destas são demasiado graves para ficarem pela mera insinuação, e a ausência de detalhes apenas serve para alimentar a especulação e enfraquecer a teoria.

24 de agosto de 2007

O DN publicou um artigo sobre a Wikipédia onde se diz: devido às sucessivas manipulações, «a credibilidade da enciclopédia online começa a ser posta em causa». Ora, desde quando a Wikipédia foi uma enciclopédia credível?

22 de agosto de 2007

Luís Filipe Menezes acha «ridículo» que se tenha criado um caso por causa de um plágio, pois considera «irrelevante» o facto de fazer passar por seus textos que não são seus. Mais: o candidato à liderança do PSD garante que o «blogue pessoal» que mantém na Internet não é feito por si mas por um assessor. Reparem bem: um «blogue pessoal» feito por um assessor, provavelmente caso único no mundo e a merecer entrada no Guinness. Mas há mais. «Uma fonte da candidatura» do autarca garantiu que a não identificação do local onde os textos foram subtraídos se deveu a um «lapso», embora «quem lê esses textos percebe perfeitamente que não são da autoria de Luís Filipe Menezes». Como se vê, as explicações são tão fracas que nem a boa vontade as tomaria por boas. Há, ainda, um curioso episódio. Segundo o Público, os textos publicados no blogue até à data da notícia terminavam dizendo que Menezes era o seu autor, e após a notícia «estourar» passaram a dizer que Menezes era, apenas, o responsável pela sua publicação. Ou seja, alguém se apressou a emendar a mão logo que foi dado o alarme, fazendo lembrar o caso do engenheiro que não era engenheiro e acabando por demonstrar que, afinal, o assunto é muito mais que «ridículo» ou «irrelevante». De facto, o caso configura uma situação em que alguém se apropriou do que não lhe pertencia, e não há volta a dar-lhe. Nem volta a dar-lhe, nem explicação que demonstre que assim não foi.

21 de agosto de 2007

A filha do presidente angolano vai processar o DN por aquilo que considerou «má prática jornalística» nas duas reportagens publicadas por aquele jornal, diz a Lusa. O estranho da notícia é que os advogados de Isabel dos Santos afirmam não estar em causa «a veracidade ou não dos factos desenvolvidos na notícia», e mais estranha se torna quando se constata que a Sábado da última semana concedeu, ao abrigo do Direito de Resposta, duas páginas aos mesmos advogados de Isabel dos Santos para estes contestarem uma reportagem publicada por aquela revista que os causídicos acharam conter incorrecções. Coincidência o facto de haver erros nas três reportagens que justifiquem um processo ou o uso do Direito de Resposta? Ou haverá aqui mais alguma coisa?
Por que razão nunca se fala do luso-americano Marc Gonçalves quando se fala dos reféns em poder das FARC? Por que razão o Governo português nunca se interessou pelo caso?
Miguel Portas mudou de ideias sobre o caso do milho transgénico e resolveu assumi-lo. A coisa não teria importância caso fosse uma prática corrente entre nós. Como não é, o gesto merece referência.
Luís Filipe Menezes fez passar por seu aquilo que não era seu.
O que terá a entrevista de Mário Crespo ao DN de tão heróico que não vislumbrei?

20 de agosto de 2007

Cada vez me parece mais evidente que a famosa central de comunicação do Governo de Sócrates é uma montanha que pariu um rato. Como se confirma com o episódio da Wikipédia (e com toda a novela da licenciatura do primeiro-ministro), a dita central funciona de forma tão atabalhoada que chego a duvidar que esteja nas mãos de profissionais competentes e experimentados.

17 de agosto de 2007

Um ligeiro problema de saúde e a participação num júri que decidiu o destino de um sujeito acusado de cometer dois crimes mantiveram-me afastado da blogosfera mais do que eu desejaria. Retomarei o ritmo habitual a partir da próxima semana.
Tempo quente

15 de agosto de 2007

«A seita dos saudáveis. É uma agremiação como a dos escuteiros, dos desportistas, das testemunhas de Jeová, dos comunistas até há pouco e assim. Não beber, não fumar, evitar a carne e sobretudo as gorduras, dar preferência aos vegetais, comer pouco e várias vezes ao dia mesmo sem apetite, deitar cedo, fazer exercícios, evitar o sedentarismo, vigiar o peso, a tensão arterial... Sim. Mas para que é que eles querem a vida, se não é para a utilizarem? Lembram os que compram roupa mas guardam-na e não a usam. O seu objectivo na vida não é viverem-ma mas cifrar a felicidade ao simples facto de a terem. São exemplares à vista — magros, direitos, ginasticados. Mas não tiram proveito disso, excepto o de serem saudáveis à custa de muito martírio. Ou seja, o de poderem gozar a vida na sua maior amplitude, que apenas é poder. A seita dos saudáveis. Vejo-os com frequência na TV. Mas tiro-lhes o som e ficam mais enfermiços.» Vergílio Ferreira, em Pensar

14 de agosto de 2007

«A arte é a apoteose da solidão.» Samuel Beckett, citado por Richard Davenport-Hines em Proust at the Majestic

10 de agosto de 2007

Decididamente que o transporte de Porto caseiro das berças para a América não me está a correr bem. Depois de ter estado à beira de ficar sem nove garrafas do dito (episódio contado aqui), uma garrafa mal arrolhada inundou-me uma mala e demolhou-me meia dúzia de livros, entre eles um João de Araújo Correia, que há-de estar a rir-se lá onde estiver. Nada de irremediável no que aos livros respeita, mas já não posso dizer o mesmo quanto ao resto. É que o resto, meus amigos, era um Porto que valia bem uma missa.

8 de agosto de 2007

Na FNAC do Porto, secção dos livros, uma funcionária pergunta a um colega: «É de quem A Cidade e As Serras