28 de fevereiro de 2005

O Daniel Oliveira está indignado com a posição do Papa face ao aborto. Compreende-se. Mas já se compreende menos que não invoque a mesma «laicidade do Estado» quando o Papa assume posições com as quais está de acordo. E ainda menos quando aplaude, como foi o caso da posição do Papa sobre a intervenção militar no Iraque. Estou à vontade para falar da questão do aborto, pois também eu discordo do Papa. Discordo mas não me parece que ponha em causa a «laicidade do Estado», como não foi posta em causa a «laicidade do Estado» quando o Papa decidiu condenar a invasão do Iraque.

24 de fevereiro de 2005

Está provado: quanto menos escrevo, mais leitores tenho. Hoje, por exemplo, tive muito mais que o habitual — e não escrevi uma linha. Assim sendo, vou-me às Memórias do Cárcere, o meu terceiro Graciliano acabadinho de chegar pelo correio.

23 de fevereiro de 2005

Eu, se fosse primeiro-ministro ou membro da Direcção do PS, fazia com este texto o que Mourinho costuma fazer com as declarações dos jornais que procuram desestabilizar a equipa que dirige antes de um jogo importante.
«Dentro de um partido, que é uma colectividade, paga-se um preço por falar livremente», disse Pacheco Pereira à Antena 1. Não será novidade para ninguém, mas é bom ouvir isto por parte de quem sabe do que fala.
Aleluia!

21 de fevereiro de 2005

Como estarão lembrados, o Conde d’Abranhos foi eleito por Freixo de Espada à Cinta sem nunca lá ter posto os pés. Aliás, ele até julgava que Freixo de Espada à Cinta ficava no Minho em vez de Trás-os-Montes, e logo que pôde «livrou-se para sempre daquela horda da carrapatos». Face a isto, apetece-me perguntar: quantos deputados destes terão sido eleitos nas últimas Legislativas?
Sim, também eu fiz uma leitura dos resultados das eleições. Só que, face às 321 que já li (ou ouvi) desde o encerramento das urnas, acho melhor guardá-la para mim. Direi, apenas, o seguinte: os portugueses foram às urnas demonstrar, de forma clara e inequívoca, que estavam fartos de Santana Lopes. Pena que ele não tenha percebido isso.
Corre por aí a tese de que a maioria absoluta do PS veio demonstrar «que os motivos que levaram [o Presidente da República] à dissolução do Parlamento eram correctos». Quer isto dizer que o Presidente da República se teria enganado caso o PS não tivesse maioria absoluta?

18 de fevereiro de 2005

Dois jornais portugueses de referência — o Público e o Expresso — tornaram-se protagonistas pelas piores razões. O primeiro porque resolveu dar uma «notícia» que não passou de um mera opinião, o segundo por dar uma notícia que se revelou falsa. Nada disto teria grande importância caso os visados não fossem políticos em campanha, no caso Santana Lopes, que ambos procuraram atingir a qualquer preço. Como se disse e repetiu, bem podem os jornais fazer «mea culpa» que o mal está feito e os objectivos alcançados. Curiosamente, O Independente — jornal por muitos considerado «sensacionalista» — foi mais sério e comedido ao dar a notícia de que José Sócrates está a ser investigado pela Judiciária, além de que, até ver, não disse nada que não tenha acontecido. A sensação com que se fica após estes episódios é que se chegou a um ponto que vale tudo, incluindo esbanjar um capital de credibilidade que não deve ter sido fácil construir.
O Miguel Sousa Tavares escreveu um artigo notável.
Além de ter sido o único blogue que se lembrou do segundo aniversário do Esmaltes e Jóias (as minhas desculpas por não ter agradecido), O Intermitente fez dois anos.

17 de fevereiro de 2005

Pior que o drama de Santana Lopes, só mesmo o drama de Pacheco Pereira. Se o do primeiro roça o exagero, o do segundo parece teatro amador.

16 de fevereiro de 2005

A Igreja Católica foi condenada por se meter em assuntos de política e, no dia seguinte, elogiada por se meter em assuntos de política. Curiosamente, os que a condenaram foram os mesmos que a aplaudiram. Isto é, gente sem memória e sem vergonha.
Será que existem mesmo eleitores que se dão ao trabalho de ler uma carta que lhes foi enviada por um político?
Consta que um grupo terrorista islâmico planeou uma série de atentados contra alvos em França, nomeadamente a Torre Eiffel, um grande armazém no centro de Paris, edifícios onde estão instalados interesses israelitas e esquadras de polícia. Ora, tendo em conta que a França foi dos países que mais se opôs à intervenção militar no Iraque, como explicar a ofensiva que só o desmantelamento da rede veio abortar? Sim, é preciso não esquecer que os atentados de 11 de Março em Madrid foram considerados «uma retaliação» pela participação espanhola no invasão do Iraque.

15 de fevereiro de 2005

Não tenho comissão nos discos, ninguém me paga para o promover, mas recomendo na mesma este senhor.
Contrariamente a José Vítor Malheiros, a quem reconheço alguma razão, não tenho dúvidas de que os blogues mudaram o jornalismo para melhor.

14 de fevereiro de 2005

O maradona (com minúscula) provou, de forma definitiva e com três gralhas (pelo menos), que não há nada como a sabedoria empírica para se atingir o nirvana: «No exercicio da manhã saiu-me um opedaço de feijão verde intacto pelo nariz, na actividade da tarde descobri que as melhores sanitas são sem sombra de dúvida as de marca Roca, e à noite fiquei a saber que acabaram com os termómetros movidos a mercurio.»
Além de ser contraproducente, não me parece inteligente atacar a comunicação social. Mas que ela tem sido globalmente contra Santana Lopes, e ainda ele não era primeiro-ministro, é um facto. O que não deixa de ser bizarro, pois Santana foi acusado de controlar a comunicação social.
Estava a ver que ninguém ia falar no assunto.
«(...) as mais recentes posições do episcopado português e as palavras do padre Lereno» são «insuportáveis quando transportadas para um espaço profano, um espaço público, para uma sociedade que, constitucionalmente, não é confessional», escreveu o director-adjunto de A Capital. Como aqui alertei há uma semana, não será isto uma tentativa de calar a Igreja Católica? Não será isto uma atitude anti-democrática?
Concordo em absoluto com a acusação de «oportunismo político» que o antigo bispo de Setúbal fez aos partidos que interromperem a campanha eleitoral por causa da morte da Irmã Lúcia, mesmo reconhecendo que é uma acusação que roçou a demagogia. Mas já não me merece tanto entusiasmo as críticas de alguns políticos, à esquerda e à direita.

11 de fevereiro de 2005

Como toda a gente sabe, o desprezo de Cavaco Silva pelo PSD não é de hoje. Isto é, não se deve ao facto de o PSD ser liderado por Santana Lopes. O problema de Cavaco Silva com o PSD é antigo e tem outros motivos, como o próprio por mais de uma vez demonstrou. Dizer que o problema do ex-primeiro-ministro é Santana Lopes, não custa nada e pode ser eleitoralmente eficaz — mas não é sério. Aliás, eu cada vez tenho mais dúvidas que o PSD, mesmo depois de correr com Santana Lopes (se é que o vai conseguir a curto prazo), apoie uma candidatura presidencial de Cavaco. As sucessivas descolagens do partido de que foi presidente são bem capazes de ter consequências desagradáveis para o ex-presidente dos social-democratas. Como, aliás, esta notícia deixa antever.
O Luís Osório acha que «não existem jornalistas livres e sérios».
Parece que a Polícia Judiciária tem obrigação de se preocupar com a «gestão política» das investigações que faz.

10 de fevereiro de 2005

Não há dia que passe sem que um barão do PSD apareça a criticar o partido de que faz parte — ou a direcção do partido de que faz parte. Hoje foi a vez de António Borges, que se diz desiludido com o rumo da campanha. Mas os piores são os que aparecem uma vez por acaso a apelar ao voto nos social-democratas quando é público que desejam uma derrota do PSD. Uma derrota, de preferência, por muitos.

9 de fevereiro de 2005

O Bloco de Esquerda está muito incomodado com a tomada de posição da Igreja Católica face às eleições do dia 20. Vai daí, resolveu pedir à Igreja Católica que se cale. Ora, será que isto não configura uma tentativa de calar vozes incómodas? Porque haveria a Igreja Católica de não poder pronunciar-se sobre o que muito bem entender? E porque é que os bloquistas não se coíbem de aplaudir a Igreja Católica sempre que ela defende o que lhes interessa e a tentam calar sempre que é contra? Não será isto uma atitude anti-democrática?
A explicação do Público sobre a alegada aposta de Cavaco Silva numa maioria absoluta do PS é mais que esfarrapada.

8 de fevereiro de 2005

Como estarão recordados, à invasão do Iraque seguiu-se as eleições no Afeganistão, na Palestina, no Iraque e, agora, na Arábia Saudita, embora estas um pouco originais. Todas elas eleições históricas, e todas elas a excederem largamente as expectativas. Hoje, Ariel Sharon e Mahmud Abbas anunciaram um cessar-fogo, coisa que o primeiro-ministro israelita não conseguiu com esse grande paladino da liberdade que foi Yasser Arafat. Como julgo ser evidente, trata-se de uma sucessão de acontecimentos que representam importantes vitórias para os povos afegão, palestiniano, iraquiano, saudita e israelita. Mas como algumas dessas vitórias representam, também, vitórias dos Estados Unidos, há quem não se conforme. E não se conforma porque o que importa é que as coisas corram mal aos Estados Unidos, tenha lá isso os custos que tiver. Que os povos sofram as consequências caso as coisas corram mal aos americanos, é um mero detalhe. Um mero detalhe que nunca os interessou e jamais os interessará. Tão claro que só não vê quem não quer.
Palpita-me que o Público de amanhã vai revelar mais detalhes acerca da alegada aposta de Cavaco Silva numa maioria absoluta do PS nas eleições do dia 20, até porque a fundamentação da notícia do dia foi fracota.

4 de fevereiro de 2005

O Francisco José Viegas resolveu chamar a atenção para o seguinte: «O parágrafo primeiro do ponto sexto do regulamento do Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores, publicado no Jornal de Letras, menciona a consignação de mensões honrosas». Ora, meu caro Francisco, então você não vê que é de uma gralha que se trata? Não vê que eles queriam dizer «mansões honrosas»?

3 de fevereiro de 2005

Pedro Santana Lopes esteve melhor do que eu esperava, José Sócrates pior do que eu esperava. Digo isto sem emoção ou interesse, pois não tenciono votar em nenhum deles. Sócrates raras vezes demonstrou à-vontade, enquanto Santana esteve como peixe na água. Santana demonstrou trabalho de casa, Sócrates raramente transmitiu convicção no que disse. Falo da forma como ambos «passaram» na televisão, mais importante que o conteúdo num debate do género. É claro que, amanhã, os jornais vão dizer o contrário, pois a clubite fala mais alto. Como é um bom exemplo o caso de Luís Osório, que eu vi na RTP jurar a pés juntos que Sócrates dominou claramente a primeira parte do debate.
Não me importava mesmo nada que me pagassem para escrever pulhices destas.

2 de fevereiro de 2005

Quem viu a entrevista de Judite de Sousa a José Sócrates e, depois, a Paulo Portas, ficou com a sensação de que não foram feitas pela mesma pessoa. Compreende-se que os jornalistas de política tenham simpatias — e não só os jornalistas de política. Mas será assim tão difícil usar apenas critérios jornalísticos quando se faz uma entrevista? Será assim tão difícil fazer uma entrevista com um mínimo de isenção e distanciamento? Será demais pedir que se adopte um critério uniforme para todos os líderes políticos? Será exagero esperar que o entrevistador se comporte como um profissional? As entrevistas a José Sócrates e a Paulo Portas chegaram a parecer um frete, no primeiro caso, e um linchamento, no segundo.
No tempo de Saddam Hussein, que ganhava eleições com 100 por cento dos votos, nada disso acontecia.

1 de fevereiro de 2005

Olha, esteve cavalheiro acha que as eleições no Iraque se realizaram devido à pressão dos «pacifistas» (as aspas são dele).