6 de agosto de 2008
UMA NO CRAVO. Escrevi, há uma semana, que o anúncio da devolução do Estatuto dos Açores à Assembleia da República não me pareceu motivo para o Presidente Cavaco interromper as férias e fazer uma comunicação ao país. Não disse na altura, mas digo agora: o secretismo que rodeou o acontecimento foi, também, escusado, pois o secretismo só podia prestar-se a exercícios de adivinhação e especulações desenfreadas. Posto isto, as críticas de Mário Soares à comunicação de Cavaco, no DN de ontem, merecem, igualmente, reparo. Essencialmente por uma razão: o ex-presidente da República começou por dizer que a intervenção de Cavaco foi «muito infeliz» (a maioria dos portugueses preparava-se para ir de férias e «esquecer (...) os problemas graves e complexos que os esperam no regresso», escreveu Mário Soares), e porque o ex-PR terminou o «raciocínio» dizendo que Cavaco deveria ter falado de assuntos «mais importantes». Ou seja, Mário Soares acha que os portugueses não deviam ser incomodados nesta altura do ano, mas depois acha que já se justificaria o incómodo caso a comunicação ao país fosse para lembrar aos portugueses o custo de vida, as crises energética e financeira, o desemprego e a corrupção, o descrédito da justiça e a paralisia em que está mergulhada a Europa, «e tantos outros problemas que os portugueses sentem na carne». Resumindo, Mário Soares deu uma no cravo, e outra na ferradura. Pior: segundo o Público de hoje, Soares vetou o mesmo Estatuto dos Açores durante o seu primeiro mandato em Belém, considerando então oportuno fazer uma comunicação ao país sobre o assunto. Foi em Setembro, como lembrou Mota Amaral, com hino e tudo.