16 de junho de 2016
CONFUNDIR O CU COM AS CALÇAS. O massacre de Orlando levanta dois problemas óbvios: a venda de armas, e o terrorismo islâmico. Do primeiro, fala-se abertamente. Do segundo, ignora-se até o impossível de ignorar. Porque o primeiro é um assunto mais ou menos popular (e mais ou menos consensual), e o segundo coloca o dedo em dois pontos hipersensíveis: a existência do islão radical, sempre pronto a matar; e a questão da homossexualidade, que não tem lugar nessa visão do islão — e por isso deve ser exterminada. Mas parece que a matança da Florida levantou um terceiro problema, menos óbvio e raramente discutido: a existência de homossexuais muçulmanos, cuja denúncia ou «saída do armário» pagam com a vida. É um bom sinal. Com seria um bom sinal discutir a sério o papel da mulher no islão (os crimes de honra, a homofobia, o machismo generalizado), outro assunto politicamente incorrecto de que os campeões da modernidade fogem como o diabo da cruz. A questão da venda de armas nos EUA deve ser encarada a sério? Com certeza que deve, embora esteja por demonstrar a relação causa-efeito, isto é, que a proibição de vender armas contribuiria para a redução dos crimes de sangue — e é bom lembrar que não há lei que impeça que se cometam massacres como o de Orlando. Mas o islamismo radical tem, igualmente, de ser encarado de frente, até porque neste caso está amplamente demonstrada a relação causa-efeito. Dir-me-ão que a proliferação de armas na sociedade civil mata mais gente que o islão radical, e contra factos não há nada a dizer. Só que discutir as armas em vez do islão radical a propósito da matança de Orlando, é confundir o acessório com o essencial. E o essencial neste caso é que o islão radical continua a matar perante o faz-de-conta de uma larga camada de bem-pensantes, que recusam trocar as reconfortantes certezas em que vivem pela mais cruel evidência.