Falta pouco mais de um mês para o lançamento do "Ensaio Sobre a Lucidez". O tal livro que, segundo o autor, vai causar «um escândalo dos diabos», ainda maior que "O Evangelho Segundo Jesus Cristo". Ora, por causa do tal «escândalo», ofereceram-me o "Evangelho" mal ele foi editado, e sabe deus como o tentei ler. Hoje fui ver onde o deixei encalhado e se mantenho a mesma opinião. Lidos os dois primeiros períodos, acho que piorou. Ora vejam:
«O sol mostra-se num dos cantos superiores do rectângulo, o que se encontra à esquerda de quem olha, representando, o astro-rei, uma cabeça de homem donde jorram raios de luz e sinuosas labaredas, tal uma rosa-dos-ventos indecisa sobre a direcção dos lugares para onde quer apontar, e essa cabeça tem um rosto que chora, crispado de uma dor que não remite, lançando pela boca aberta um grito que não poderemos ouvir, pois nenhuma destas coisas é real, o que temos diante de nós é papel e tinta, mais nada. Por baixo do sol vemos um homem nu atado a um tronco de árvore, cingidos os rins por um pano que lhe cobre as partes a que chamamos pudendas ou vergonhosas, e os pés tem-nos assentes no que resta de um ramo lateral cortado, porém, por maior firmeza, para que não resvalem desse suporte natural, dois pregos os mantêm, cravados fundo.»