8 de maio de 2009
OS LIVROS DA MINHA VIDA. Partilhei, em tempos, breves momentos com uma boa alma que me jurou ter lido O Velho e o Mar uma dezena de vezes. Pelo entusiasmo com que me falou do livro, e de Hemingway de um modo geral, nunca me passou pela cabeça que estivesse a exagerar. Como ainda não tinha lido o livro em questão, fiquei, naturalmente, curioso, pelo que tratei de o ler logo que tive oportunidade. Já não me lembro bem dos detalhes, mas lembro-me que só não o abandonei logo às primeiras páginas porque uma espécie de campainha me lembrava a todo o instante a dezena de vezes que a boa alma o tinha lido, e convenhamos que um livro que alguém leu uma dezena de vezes merece um esforço. Embora se trate de um caso fora do comum, não foi a primeira vez que deparei com um entusiasta invulgar de um livro. O tempo foi-me habituando a ouvir maravilhas de livros que abandonei a meio (ou terminei a custo), e já não me surpreende que vulgarizem títulos (ou autores) que são, para mim, referência. Mas o tempo também me foi ensinando que há livros (e autores) sobre os quais nunca vi duas opiniões. Poucos, é um facto, mas há. Eça de Queirós e Cardoso Pires, para só falar de portugueses, são autores de quem nunca vi dizer mal. Por que será? Como julgo evidente, porque Eça e Cardoso Pires foram de tal modo excepcionais que nem mesmo os menos entusiastas das suas obras se atrevem a dizer mal. Não por razões de politicamente correcto, no caso literariamente correcto, mas porque lhes reconhecem qualidades difíceis de encontrar nos seus pares. Afinal, se não é bom o que eles nos deixaram, é bom o quê? Sim, já ouço para aí dizer que tudo isto é relativo. Desconfio, no entanto, que é o mesmo «relativismo ignorante» de que ainda há pouco falava Miguel Esteves Cardoso, que pretende tornar igual o que não é igual, e bom aquilo que é mau. O mesmo «relativismo ignorante» que mais não é que uma forma de cobardia, pois assim nos furtamos a dizer o que pensamos (se é que pensamos alguma coisa) e julgamos ficar de bem com Deus e com o Diabo, como se ficar de bem com um não implicasse ficar de mal com o outro.