29 de julho de 2011

A PEIXEIRADA.



De um modo geral, não aprecio as ideias e os métodos de Alfredo Barroso, mas não vi razão para tanta irritação quando ele citou, no já famoso debate, uma série de factos, alegando a parceira de discussão que Barroso procurava, com os factos citados, baixar o nível do confronto, como se os factos citados por Barroso fossem irrelevantes para o tema em análise. Também não percebi os motivos que levaram Teresa Caeiro a desqualificar o adversário, com a agravante de invocar inverdades, muito menos em que assenta a superioridade que julga ter. Provavelmente a irritação da senhora já vem de trás, mas ainda assim não percebo. É que Barroso nada disse que possa ser visto como uma descida ao lamaçal, para usar a expressão de Caeiro, muito menos que justificasse a peixeirada. A única coisa em que Teresa Caeiro esteve bem foi recusar o inacreditável momento «perdoa-me» que Mário Crespo propôs. No resto, foi lamentável. Lamentável na irritação, lamentável na sobranceria, lamentável na impreparação para discutir os temas em debate.
CONTINUE ASSIM QUE VAI MUITO BEM. «Continuarei incapaz de renovar o estilo da minha prosa, que alguns qualificam de antiquado; as ideias que tenho permanecerão confusas; o esforço que o escrever me causa não diminuirá; a incerteza e a inquietude vêm-me de nascença.»

28 de julho de 2011

FARINHA DO MESMO SACO. Diz o actual Governo que não conhecia a real dimensão do descalabro das contas públicas, assim procurando justificar um aumento de impostos que enquanto oposição garantiu não fazer. Ora, se o actual Governo não conhecia o descalabro, como podia, em campanha eleitoral, prometer não aumentar os impostos e fazer disso bandeira? Mas há mais: o aumento dos impostos, a haver, nunca incidiria sobre os rendimentos de quem trabalha, mas sobre o consumo. Não sou especialista no assunto de modo a saber se o Governo tomou, no caso, a medida adequada. Mas julgo poder dizer, sem margem de erro e com base apenas nos factos, que o actual Governo mentiu aos portugueses. Em matéria de seriedade, de que agora tanto se fala e tanto se pede, estamos, portanto, conversados.
SÉRIO CANDIDATO A TÍTULO DO ANO. Director do fisco da Madeira criou empresa off-shore
E AINDA SÓ ESTAMOS NO COMEÇO. O albergue espanhol

26 de julho de 2011

JORNALISMO DE INVESTIGAÇÃO. O caso News of the World pôs à vista uma situação cada vez mais evidente: quando os media conseguem revelar situações destas já demasiada água passou debaixo das pontes por demasiado tempo. Por variadíssimas razões, mas essencialmente devido à escassez de jornalismo de investigação. Saúda-se, por isso, a iniciativa do Público, que anuncia um protocolo com meia dúzia de empresas que lhe irá garantir meios que lhe permitirão fazer jornalismo de investigação – embora, a partir de agora, eu não acredite na independência do Público face às empresas que o patrocinam, muito menos que lhes continuem a dar tratamento idêntico ao que darão a outras empresas, como garante a sua direcção editorial. Pela simples razão de que, como diz o outro, não há almoços grátis.

22 de julho de 2011

INCOMPATIBILIDADES. A notícia já tem barbas (há um mês que os factos eram conhecidos), mas é sempre bom repetir que um terço dos deputados da anterior legislatura (70 dos 230) desenvolvia actividades inconciliáveis com os assuntos que defendiam no Parlamento. E seria bom, já agora, que se apurasse quantos deputados, na actual legislatura, se encontram em situação idêntica, e divulgar os seus nomes. Haverá coragem para isso?
DO PROVINCIANISMO. Os portugueses não perdem uma oportunidade para atribuir nomes estrangeiros a tudo o que seja «eventos». Havia necessidade de chamar World Bike Tour a um passeio velocipédico entre o Porto e Matosinhos?

20 de julho de 2011

ENTRETANTO, NA MADEIRA (2). Dois dias após mais uma peixeirada, com o presidente do PSD local a chamar nomes a um jornalista e a mandá-lo para o sítio que estão a pensar, eis que mais notícias da Madeira nos dão conta que os presidentes do Governo regional (Alberto João Jardim) e da Assembleia Legislativa (Miguel Mendonça) andam a abotoar-se com milhares de euros que, segundo a Caixa Geral de Aposentações, não têm direito. O presidente do parlamento local já fez saber que discorda da Caixa. E, pormenor curioso, «requer que [lhe] seja facultada a identificação dos funcionários que tenham desencadeado ou intervindo neste procedimento». Estão a ver para quê?
10 questions from the Guardian to Downing Street

18 de julho de 2011

ENTRETANTO, NA MADEIRA (1). Andamos tão entretidos com o rating e com o aumento dos impostos que não prestamos a atenção devida ao que se passa na Madeira, de onde nos chegam notícias inquietantes. Diz o Tribunal de Contas que o Governo local aplicou menos de um terço das verbas que lhe foram atribuídas para a reconstrução das zonas afectadas pelo temporal do ano passado e que não se sabe para onde terá ido o resto (34,9 milhões de euros), e o Público diz que Jardim proibiu a Assembleia Legislativa da Madeira, o governo regional, o PSD local, o Jornal da Madeira e o mais que não se sabe de receber a Comissão Nacional de Eleições que se vai deslocar ao território para preparar as eleições regionais. Dizem mais as notícias: passaram quatro dias e ninguém, absolutamente ninguém, fez a mais leve crítica, incluindo os políticos eleitos, de quem se esperaria que fossem os primeiros a exigir o cumprimento das regras e a reclamar a punição de quem prevarica. A república das bananas em que a Madeira se tornou nos últimos anos deve-se, em primeiro lugar, a quem lá manda, mas o silêncio dos políticos e dos governantes, ou a mera desculpabilização de Jardim a pretexto de que ele fez obra (como fosse difícil fazer obra desta maneira), é tão ou mais responsável pelo que por lá se pratica. A começar pelo presidente da República e pelo primeiro-ministro, que têm a obrigação de accionar os mecanismos necessários de forma a impedir — ou punir — estas poucas-vergonhas.

14 de julho de 2011

COISAS QUE NÃO PERCEBO. Por razões conhecidas, as agências de notação financeira merecem-me todas as reservas. Mas não será uma forma de pressão prescindir dos seus serviços quando elas emitem opiniões que nos prejudicam, como fizeram algumas autarquias? As agências de rating são sérias e competentes quando o resultado das suas avaliações nos interessa e já não são quando nos prejudica? Também não percebi como se podem extinguir alegando que elas têm um poder excessivo, em certos casos talvez ilegítimo. Quem pode impedir uma pessoa individual ou empresa de emitir opiniões sobre o desempenho financeiro de entidades públicas ou privadas, empresas ou governos? Estarei a ver mal, mas as agências de rating só perderão o poder que têm quando o mercado deixar de acreditar nelas, coisa que, até ver, não estará para breve.
AINDA NÃO PAREI DE ME RIR. Ministra dispensa uso de gravata na Agricultura para poupar no ar condicionado
AI A EUROPA. «Não se enganem: o grande motor da integração europeia não tem sido a vontade dos povos mas a distracção dos povos).» (...) «A Europa tem uma caterva de pessoas espalhadas por instituições e think-tanks cuja única ocupação é meditar sobre o seu destino.» Pedro Lomba no Público de hoje
MUNDO ÁRABE. Quando os factos insistem em dar cabo das mais belas teorias.
Um texto obrigatório de Duarte Lino.

12 de julho de 2011

THE TAO OF TRAVEL. Pawl Bowles escreveu em The Challenge to Identity o seguinte sobre os livros de viagens: «What is a travel book? For me it is the story of what happened to one person in a particular place, and nothing more than that; it does not contain hotel and highway information, lists of useful phrases, statistics, or hints as to what kind of clothing is to be needed by the intending visitor.» Os escritores de viagens, que nos últimos anos se multiplicaram como cogumelos, deviam pensar nisto antes de escreverem livros que não se distinguem de meros guias da especialidade ou da enciclopédia, com a vantagem de estas obras de referência serem mais fiáveis no que aos factos respeitam. Um conselho, já agora, de Paul Theroux, provavelmente o maior escritor de viagens no activo: «Choose your country [to travel], use guidebooks to identify the areas most frequented by foreigners — and then go in the opposite direction.» O conselho vem no seu título mais recente, The Tao of Travel, um livro a fazer lembrar uma bíblia num primeiro olhar e um Moleskine após um olhar mais demorado — e graças ao qual engrossei a minha lista de compras com mais meia dúzia de títulos.

8 de julho de 2011

ABAIXO DE CÃO. A propósito da privatização da televisão do Estado, que a concorrência se apressou a achar mal porque a dita é uma coisa bonita se for para os outros, quem, na RTP, é responsável pela emissão de um «programa de humor» que dá pelo nome de Portugal Tal & Qual? Ouço amiúde que determinado programa se destina à classe A ou à Classe B, assim se pretendendo designar a qualidade do produto e o seu público-alvo. Seguindo este critério, a qual delas se destinará este Portugal Tal & Qual?

6 de julho de 2011

QUEM ANDA À CHUVA, MOLHA-SE. Quando um país pede dinheiro à banca a juros variáveis sabe de antemão que os juros podem subir ou baixar, e que por essa razão pode pagar mais ou pagar menos. Sabe, também, que uma eventual melhoria ou agravamento das taxas de juro não depende, apenas, do seu desempenho financeiro, ou lá como se chama. Não é assim? Para mim, que nada sei de economia e finanças, parece-me evidente que é assim. Também não me agrada o excessivo poder das agências de notação, e estou para ver uma investigação que mostre quem são os seus proprietários, como funcionam, como é possível terem tanta credibilidade apesar de erros clamorosos, e quem lucra e quem perde com as suas actividades. Mas imaginem que não havia agências de avaliação de risco ou outros serviços similares. Quem nos emprestaria um cêntimo?
ONDE É QUE EU JÁ ESTE FILME? (2) «Passos afirmou em campanha que era um disparate falar do confisco do subsídio de Natal? Afirmou! Passos garantiu que não subiria os impostos e que, se em rara hipótese o fizesse, taxaria o consumo e nunca o rendimento? Garantiu! Passos prometeu suspender o processo de avaliação do desempenho dos professores? Prometeu! Mal tomou posse, sem pudor, confiscou, taxou e continuou. O homem de uma só palavra mostrou ter várias. Ética política? Que é isso? Confiança? Para que serve isso? Relação adulta? Que quer isso dizer?»

4 de julho de 2011

UMA RENÚNCIA ANUNCIADA. A renúncia de Fernando Nobre ao cargo de deputado apenas surpreende quem não acompanhou a sua passagem pela política. Desde cedo se percebeu que o estimável presidente da AMI era pior que os políticos contra os quais investiu com uma candidatura que se reclamava da «cidadania», «cidadania» essa que não hesitou em trocar por um prato de lentilhas logo à primeira oportunidade, apesar de pouco antes jurar que jamais aceitaria qualquer cargo político. A humilhante derrota no parlamento, apesar do apoio do actual primeiro-ministro e do maior grupo parlamentar, acabou por fazer justiça, deixando antever a saída pela porta das traseiras que hoje se consumou. Escusava era de vir justificar a renúncia por se considerar «mais útil aos portugueses» na «acção cívica e humanitária», como se os portugueses, incluindo os que votaram nele, não conhecessem os verdadeiros motivos da renúncia. Perdoem-me a crueldade, mas um sujeito que andou a enganar os portugueses (apresentou-se a sufrágio prometendo exercer o cargo de deputado caso não fosse eleito presidente da AR) merecia pior fim do que teve.
AO CUIDADO DE NUNO CRATO. «Assim, porque sei das crenças, da autenticidade, do imenso saber, da paixão como professor e da hiper-informação do actual Ministro da Educação, sinto-me no dever de proclamar, quase à maneira de Guerra Junqueiro, que o nosso sistema educativo, caso se mantenha a actual entropia e o consequente lixo não incinerado, corre o risco de só poder dar alguma luz quando arder.» Extracto de (mais) um texto notável de José Adelino Maltez, no Albergue Espanhol.