30 de novembro de 2015
TERMINAR O MANDATO SEM DIGNIDADE. Fez bem o Presidente Cavaco anunciar em comunicado a indigitação de António Costa como primeiro-ministro. Poupou-nos a um discurso penoso, e poupou-se a um exercício que lhe seria ainda mais penoso. Mas com ou sem discurso, de uma coisa Cavaco já não se livra: foi, na opinião de muitíssima gente (a minha incluída), o presidente mais ridículo da democracia portuguesa. Foram vários os episódios que protagonizou que mancharam o cargo que ainda desempenha. Desde o inacreditável discurso que pôs fim à não menos inacreditável historieta das escutas, ao discurso em que ameaçou excluir de uma solução governativa dois partidos com representação parlamentar que na hora todos perceberam que não podia fazê-lo — recentemente acrescentados com um incidente com o Parlamento e com mais um lamentável discurso na tomada de posse do novo Governo. Como já é tarde para o ajudar a terminar o mandato com dignidade, como o próprio Cavaco em tempos pediu para o então Presidente Mário Soares, resta-nos a boa notícia de que deixará de ser Presidente daqui a três meses.
21 de novembro de 2015
PARA QUE NADA FIQUE COMO DANTES. Não sei se o Presidente Hollande agiu bem quando decidiu reforçar a ofensiva militar contra o Estado Islâmico logo a seguir aos massacres de Paris, embora me tenha parecido uma reacção a quente — e as reacções a quente não costumam dar bons resultados. Mas como ainda não vi quem se opusesse ao reforço da ofensiva militar contra quem, pelo menos numa fase inicial, tem que ser contido pela via das armas, alguma coisa mudou. Claro que o facto de Hollande ser de esquerda facilita, e muito. Fosse ele de direita, e já meio mundo lhe tinha caído em cima. (Recordo que sou independente, mas em matéria de defesa geralmente alinho à direita.) Os governos ocidentais parecem acordar de um pesadelo que cresce de dia para dia, que não se vê como possa conter-se com paninhos quentes — como, por acção, mas sobretudo omissão, se tentou até agora. Governos ocidentais de direita e de esquerda, o que é uma novidade — e, na minha opinião, um progresso. Como escrevi por ocasião do 11 de Setembro de 2001, estamos diante um cenário em que é preciso matar para não morrer. Sim, não há que ter medo das palavras: matar, ou morrer. É tempo de parar de fingir que se não vê o que todos vêem. De desvalorizar o que é demasiado sério para se desvalorizar, de relativizar o que não é relativo, de justificar o injustificável. De adoptar medidas que melhor protejam os cidadãos, pagando os custos (prescindindo de algumas liberdades individuais, por exemplo) que elas terão. A matança indiscriminada de inocentes em nome de uma ideia de Deus não merece contemplações. É tempo, por isso, de agir. De forma determinada, e com eficácia. De disparar primeiro e perguntar depois se preciso for.
20 de novembro de 2015
PÉROLAS A PORCOS. Li, há uns anos, uma biografia de Modigliani (Modigliani: A Life, de Jeffrey Meyers), e fiquei a saber que o pintor italiano viveu com grandes dificuldades, morreu doente e na miséria. Choca, por isso, saber que acaba de ser vendida, por uma quantia obscena (158,3 milhões de euros), uma das suas obras (Nu Deitado). Não que me escandalize o valor da obra, até porque a pintura é uma coisa única, irrepetível. Mas é irónico ver obras de quem passou toda a espécie de dificuldades, que muitas vezes usou para pagar a renda de casa e ir às meninas, serem disputadas pelos senhores do dinheiro, que as vêem apenas como valiosos «activos». Morreria de susto o pintor caso voltasse do sítio onde está. Mas suspeito que não sem antes rir a bom rir com a parolice de alguns media norte-americanos (CBS, CNBC, Bloomberg TV e The Financial Times), que ilustraram a notícia do Nu com a reprodução censurada. Se ele se tivesse lembrado disso enquanto por cá andava, talvez não tivesse morrido na miséria.
JORNALISMO DE FACÇÃO. Instalou-se a ideia segundo a qual não há — nem pode haver — jornalismo objectivo, factual, isento. De facto, lendo com atenção o que por aí se diz e publica, nota-se bastante. Voluntariamente ou não, os jornalistas não se inibem de deixar transparecer o que lhes vai na alma, quando se esperaria que se limitassem a dar-nos o máximo de informação com o máximo de rigor e isenção possíveis. Tirando um caso ou outro, não vejo quem se rale com isto. A Entidade Reguladora para a Comunicação Social não terá aqui uma palavra a dizer?
16 de novembro de 2015
O PODER E O POVO. Como disse Henry Kissinger, o poder é o maior dos afrodisíacos. Deve ser por isso que nos últimos dias assistimos, em Portugal, a manobras desesperadas dos vários quadrantes políticos. Uns desesperam para tomar o poder, outros desesperam para o manter. Se no final as coisas correrem mal, como alguns vaticinam e muitos desejam, os fornicados seremos nós. (O título deste post foi roubado a Vasco Pulido Valente, que tem um livro com esse nome.)
10 de novembro de 2015
É A DEMOCRACIA, ESTÚPIDO. Também eu desconfio de um Governo PS com o apoio parlamentar do PC e do Bloco, por tudo o que foi dito e não vou repetir. Desconfio que vai ser mau para o país, mau para o PS, e que António Costa vai ficar à mercê dos humores do PC e do Bloco. Talvez pior: o PS arrisca-se a ficar irreconhecível, talvez em cacos, e o resultado de uma eventual desintegração não se adivinha famoso. Mas daí até dizer-se que vem aí o fim do mundo, vai um abismo. Bloco e PC não podem ser automaticamente excluídos de uma solução de Governo, a pretexto de que têm divergências de fundo com o PS e com o próprio sistema político — como o Presidente da República, em mais um lamentável discurso, defendeu, ameaçando excluí-los de uma solução governativa. Ambos têm deputados eleitos, que uma vez somados aos deputados do partido que se propõe governar constituem uma maioria parlamentar capaz de viabilizar um Governo. Queiramos, ou não. Gostemos, ou não. Como disse um ilustre político, é a democracia. E eu sou, antes de tudo, um feroz defensor da democracia. Diria mais: prefiro os defeitos da democracia às virtudes de todos os outros sistemas que se conhecem.
2 de novembro de 2015
CUIDADO COM ELE. Calvão da Silva, novíssimo ministro da Administração Interna, o tal que atestou a idoneidade do então banqueiro Ricardo Salgado perante o Banco de Portugal quando o ex-dono-disto-tudo se «esqueceu» de declarar ao fisco 14 milhões de euros recebidos do construtor José Guilherme sabe-se lá por que bons ofícios prestados invocando o nobre «espírito de entreajuda e solidariedade», foi a Albufeira inteirar-se da calamidade causada pelo mau tempo, e de caminho dar uma lição de moral aos desgraçados que sofreram elevados prejuízos e aparentemente não têm quem lhes valha. Segundo ele, para os lesados que não têm seguro a calamidade de ontem «é uma lição de vida», pois devem aprender «que é bom reservar sempre um bocadinho para no futuro ter seguro». Ter «um pequeno pé-de-meia, em vez de o gastar a mais aqui ou além, paga um prémio de seguro», disse o ministro, que teceu ainda umas considerações
piedosas sobre a vítima mortal que a tempestade causou, que diz ter-se entregado «a Deus e Deus com certeza que lhe reserva um lugar adequado». Claro que, se tudo correr conforme o previsto, o cavalheiro passará à história daqui a uma semana, quando o Governo for pró maneta. Mas, pelo sim, pelo não, seria bom recomendar-lhe prudência e recato. É que pode haver mais calamidades daqui até lá, e ele é bem capaz de fazer mais asneiras.
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