21 de abril de 2016

QUE DEUS TENHA MISERICÓRDIA DO BRASIL. Trinta e seis dos 65 deputados que integraram a comissão que votou pela abertura do processo de destituição da Presidente Dilma Rousseff, o chamado impeachment, está a contas com a justiça. Há 35 partidos políticos no Brasil, 25 dos quais com representação parlamentar — e mais 20 em processo de formação. Os detentores de cargos políticos mudam de partido como quem muda de camisa. Compram-se, literalmente, votos, quase sempre com dinheiros públicos. O ónus da prova está justamente invertido: os detentores de cargos políticos são desonestos até prova em contrário. Grande parte são suspeitos, ou mesmo acusados, de corrupção. O que têm em comum Michel Temer, que assumirá a Presidência no caso de Dilma ser afastada, Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados, e Renan Calheiros, líder do Senado? Todos apoiaram a destituição da Presidente, e todos são acusados, ou suspeitos, de corrupção. Mais de metade dos 513 deputados enfrentam processos judiciais, maioritariamente por crimes de corrupção. No passado domingo, a votação do impeachment na Câmara de Deputados foi o que se viu: uma sucessão de episódios grotescos, que fizeram rir meio mundo e embaraçaram os brasileiros com vergonha na cara. Eis o contexto em que a Presidente enfrenta um processo de destituição — por violação da lei orçamental, que terá, segundo os opositores, servido para mascarar as contas públicas de modo a criar um ambiente favorável à sua reeleição (como sucedeu), e que, provavelmente devido à sua complexidade, nenhum deputado invocou no momento da votação. Como despudoradamente dizia o presidente da Câmara dos Deputados antes de votar a favor do impeachment, «que Deus tenha misericórdia desta nação». Mas parece-me, como agnóstico, que nem a infinita misericórdia de Deus chegará para tirar o Brasil do gigantesco buraco em que se meteu.