28 de fevereiro de 2006
Confesso que já achei mais graça à gripe das aves. Como todas as epidemias anunciadas mas nunca concretizadas, também eu me convenci desde o início que estávamos perante mais uma epidemia que dois meses depois de anunciada já ninguém se lembra do nome. Afinal, parece que a coisa é mais séria do que se pensava, e é bem capaz de haver riscos de uma epidemia generalizada. As autoridades sanitárias portuguesas já garantiram que está tudo a postos, que há um plano de emergência. Ninguém acredita, é claro, mas pode ser que não seja nada.
A publicação dos cartoons foi uma estupidez, disseram os mais moderados. A publicação dos cartoons foi um acto racista, disseram os mais radicais. Mas há uma coisa que ficou por dizer: será que alguém teria dado pela bonecada caso não tivesse havido uma acção concertada com a finalidade que todos sabemos? Pois é, não custa nada fazer juízos de valor à posteriori, mas é bom não perder de vista o que está na origem do que se pretende julgar.
Muito oportunos os extractos do testemunho de Elie Wiesel a um tribunal francês publicados na Rua da Judiaria.
27 de fevereiro de 2006
23 de fevereiro de 2006
Como as pessoas entenderam mal as suas palavras e lhe terão atribuído declarações «com base em afirmações truncadas», o ministro dos Negócios Estrangeiros resolveu publicar uma carta no Público para esclarecer melhor a trapalhada à volta dos cartoons. E que diz Freitas do Amaral sobre tão delicada matéria? Diz que a liberdade de expressão «tem limites legais e deve ser usada com bom senso»; que pretendeu apelar ao bom senso e não «contribuir para a escalada do conflito» com «mais achas para a fogueira»; que a guerra do Iraque foi, para os muçulmanos, «uma ofensa do Ocidente aos povos islâmicos»; e que o tão glosado campeonato de futebol entre árabes e europeus mais não foi do que uma parcela de um vasto pacote de medidas com vista à promoção do diálogo entre as partes, de que também faziam parte «encontros de professores e cientistas dos dois lados, de escritores e artistas, de historiadores, de teólogos, de empresários e sindicalistas, de comerciantes, de jovens» e sabe-se lá que mais. Ora, para começar, salta à vista que não compete ao ministro contestar os «limites legais» da liberdade de expressão mas aos tribunais, e não consta que tenha havido alguma queixa. Depois, que bom senso é esse que condena quem faz as caricaturas e esquece quem a elas reage matando e incendiando? Não será isso deitar ainda mais achas para a fogueira? Finalmente, que dados tem Freitas do Amaral que lhe permitam concluir que os muçulmanos — todos os muçulmanos — foram contra a invasão do Iraque? Razão têm os que resumiram a posição do ministro dos Negócios Estrangeiros ao episódio do futebol entre árabes e europeus, pois ele ilustra bem a ligeireza (para não dizer leviandade) com que Freitas do Amaral geriu o assunto desde a primeira hora e a forma como, agora, com a publicação do esclarecimento onde nos passa um atestado de estúpidos (ou de mal-intencionados, ou as duas coisas), pretende encerrar o assunto.
22 de fevereiro de 2006
Será que o Francisco José Viegas podia meter uma cunha ao dr. Sousa Homem para que ele, ou alguém por ele, coloque online as crónicas do suplemento do DN?
21 de fevereiro de 2006
Como já disse, a condenação do historiador britânico seria ridícula se não fosse trágica. Mas há um pormenor que distingue esta condenação do episódio das caricaturas: foi feita por um tribunal, ao abrigo da lei. Goste-se ou não da legislação austríaca sobre tão delicada matéria, este facto faz toda a diferença. Claro que a proibição de se dizer que o Holocausto não existiu é pior do que negar o Holocausto, mas isso é outra conversa.
20 de fevereiro de 2006
Já disse trinta vezes o que penso acerca dos judeus e do Holocausto. Não vou, portanto, repetir-me. Mas a condenação a três anos de prisão de um historiador que há 17 anos cometeu o «crime» de ter negado o Holocausto seria ridícula se não fosse trágica. Sim, parece que há uma lei austríaca que criminaliza até dez anos de prisão quem nega ou justifica o Holocausto, mas só pode ser uma lei estúpida.
16 de fevereiro de 2006
15 de fevereiro de 2006
Não será caso para pedir uma avaliação das faculdades mentais, como o deputado da Madeira, mas não há dúvida que esta senhora está com um problema de saúde.
14 de fevereiro de 2006
Consta que o embaixador do Irão em Lisboa elogiou o comportamento do ministro Freitas do Amaral por este ter dito «coisas muito positivas e muito lógicas» acerca do episódio das caricaturas. Consta, ainda, que Mohammed Taheri terá dito que «há muito por contar» sobre o Holocausto, pois as suas contas sobre o assunto dizem-lhe que «para incinerar seis milhões de pessoas seriam precisos 15 anos». Consta, por último, que a ilustre criatura perguntou ao primeiro-ministro dinamarquês: «Que liberdade é esta que vocês têm que vos permite dizer o que querem de outros santos de outras religiões?» Infelizmente não consta que alguém lhe tenha dito que é a mesma liberdade que lhe permite dizer estas e outras baboseiras sem que nada lhe aconteça.
13 de fevereiro de 2006
O ministro dos Negócios Estrangeiros resolveu dizer que Portugal «lamenta e discorda» da publicação dos cartoons sobre o profeta Maomé e não dizer uma palavra sobre a violência daí resultante. Acusado de falta de solidariedade para com o parceiro europeu e de não ter condenado a reacção islâmica, Freitas do Amaral disse que não compreenderam bem o que ele tinha dito, e que a coisa até lhe dava vontade de rir. Agora, o ministro acha que o Ocidente tem sido o «maior agressor» do mundo islâmico, e que uns joguitos de futebol entre árabes e europeus talvez acalmem os ânimos (sobretudo se os segundos facilitarem a vida aos primeiros, presumo eu). Como já toda a gente disse e repetiu, o ministro dos Negócios Estrangeiros fez asneira atrás de asneira. O que inicialmente parecia um lapso (imperdoável, mas um lapso), confirma-se todos os dias que não foi. O homem pensa assim mesmo, e não há nada a fazer. Só não percebo que haja quem se interrogue se Freitas do Amaral disse o que disse em nome pessoal ou em nome do Governo. Afinal, desde quando um ministro tem opiniões políticas pessoais?
9 de fevereiro de 2006
Bastava que o Islão dito moderado (e supostamente maioritário) se levantasse nos sítios onde pode levantar-se (na Europa e nos Estados Unidos, por exemplo) e se demarcasse dos distúrbios por causa dos cartoons para acalmar a fúria fundamentalista. Isto no caso de haver um Islão moderado, bem entendido, pois está por demonstrar que existe um Islão moderado. Aliás, está por demonstrar que o Islão é uma religião de paz.
«O desiderato liberal de que hoje desfrutamos custou muito sangue, suor e lágrimas e é um dos bens mais inestimáveis da nossa civilização. A sua defesa não se compadece com posições equívocas e é, por isso, lamentável assistir ao desfile de ambiguidades de políticos timoratos.» Mário Bettencourt Resendes, DN
8 de fevereiro de 2006
7 de fevereiro de 2006
Sempre que se comete um atentado em nome do Islão, logo se diz que foi obra de fundamentalistas. Ora, como estou convencido de que grande parte dos não muçulmanos não distingue o Islão radical do Islão moderado, presumo que se tenda a julgar os segundos iguais aos primeiros. Pior: tende-se a julgá-los a todos como radicais, no mínimo potencialmente perigosos. E porquê? Porque os ditos moderados só se demarcam de atentados e afins se um jornalista lhe meter um microfone à frente a perguntar-lhes o que pensam dessas práticas. Caso assim não seja, ficam calados e caladinhos. Na melhor das hipóteses, não se ouvem as suas vozes. Quer isso dizer que os ditos moderados condenam pela frente o que por trás aprovam? Se não é assim, parece.
O episódio da censura à actuação dos Rolling Stones no intervalo da final do campeonato americano de futebol — o Superbowl — foi duplamente ridículo. Ridículo porque a organização do evento não deveria ter contratado uma banda que já se sabia que proferia obscenidades que não estava disposta a tolerar, e ridículo porque os Stones se sujeitaram à censura.
O Daniel Oliveira quer convencer-nos de que a reacção dos muçulmanos quando alguém ofende a sua religião é semelhante à reacção dos judeus ou cristãos quando alguém se mete com a religião deles. Acontece que não é. Os judeus e cristãos não destroem embaixadas nem apelam à morte de quem se mete com o deus deles. E isto, que ele finge ignorar, faz toda a diferença.
1 de fevereiro de 2006
A sensação com que fico após assistir à polémica da crítica literária é que ninguém faz fretes a ninguém, que não há capelinhas ou arranjinhos, que não se fazem omissões deliberadas ou se sobrevaloriza quem não merece. Mas devo dizer que o facto de os críticos se pronunciarem sobre os livros dos amigos — a questão que está no centro desta polémica — nunca me perturbou, até porque nunca soube quem é amigo de quem. Os meus problemas com a crítica literária (sim, também eu tenho problemas com a crítica literária) são os argumentos (quase sempre fraquinhos ou incompreensíveis) usados pelos críticos para defenderem este ou aquele livro. Que me falem bem do livro do amigo ou mal do livro do inimigo, é-me indiferente. O que eu quero realmente saber é o que pensam dos livros e com que fundamento. É que eu estou farto de críticas literárias que não dizem rigorosamente nada sobre os livros que é suposto criticarem, e de críticas que defendem uma ideia que os exemplos contrariam. São tantos os exemplos do que digo que sempre que ouço falar de crítica literária me vem logo à memória García Márquez quando, instado por um jornalista brasileiro a dizer o que pensava acerca dos críticos que analisavam a sua obra, respondeu deste modo: «A mi me gustan mucho los críticos, principalmente quando jugan fútbol.»
Provavelmente haverá razões para condecorar Bill Gates e achar que Portugal vai ganhar com o investimento da Microsoft, mas a atenção que está a ser dada à visita a Portugal do homem mais rico do mundo chega a ser provinciana. Bill Gates terá mais importância do que muitos presidentes da República, mas o comportamento dos políticos portugueses chega a ser terceiro-mundista.
«Derrota empírica»? Por amor de deus! Isso de Cavaco Silva ter ganho as eleições mas não ter ganho com a margem que não sei quem estava à espera — e, agora, por menos não sei quantas décimas do que foi anunciado — é muito mais do que mau perder: é ridículo.
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