27 de dezembro de 2013

DESVERGONHA. Que atire a primeira pedra quem nunca pecou. Mas há coisas que não se percebem, por mais voltas que se dê ao miolo: como é possível um jornalista que se prestou a este triste papel continuar por aí a vender bitaites? Se o cavalheiro não tem vergonha na cara (e está demonstrado que não), e a Comissão da Carteira Profissional de Jornalista não viu motivo para lhe retirar a licença, lamenta-se no primeiro caso, estranha-se no segundo. Que o sujeito colabore nos media assumidamente conotados com este ou aquele clube, não me chocaria. Mas que os media ditos sérios, como o Expresso e a RTP, contratem os seus serviços, já acho surpreendente. Haverá um só leitor (ou espectador) que lhe atribua um pingo de credibilidade? Se há, decerto não ouviu a gravação que por aí anda, cuja autenticidade não vi quem contestasse e recomendo vivamente.

24 de dezembro de 2013

23 de dezembro de 2013

PÚCARO BÚLGARO. Custou-me os olhos da cara, mas vale cada grama que pesa. Falo d’O Púcaro Búlgaro, romance que perseguia há anos. De um magricelas de 110 páginas, que terá demorado 20 dias a escrever e Cardoso Pires considerou uma obra-prima. Já comecei a caça aos restantes, ao que parece esgotadíssimos, e os poucos que há a preços exorbitantes. Como é possível um escritor como Campos de Carvalho ser ainda hoje praticamente um desconhecido?

19 de dezembro de 2013

PROFESSORES (4). Sei que é uma batalha perdida sair em defesa do ministro da Educação, deste ou anteriores, e nos tempos que correm muitíssimo impopular. Mas há uma pergunta que gostaria de ver respondida: é, ou não, verdade que existem deficiências na formação de professores em algumas escolas? Será preciso nomear uma comissão ou contratar um detective para saber que existem? Assim sendo, porquê tanto escandaleira pelo facto de Nuno Crato se limitar a dizer o óbvio?
PROFESSORES (3). Quem olha para os professores do ensino público (ou candidatos a isso) e seus legítimos representantes (sindicatos e federações sindicais) com um mínimo de distanciamento tende a dar razão a todos quantos foram, são ou venham a ser ministros da Educação. Por uma razão cada vez mais evidente: nada que os ministros decidam sobre os professores está certo para os ditos. Sucessivos ministros da Educação e sucessivas políticas educativas adoptadas pelos diversos ministros foram, segundo os professores e seus representantes, todas desastrosas. Ontem foi a avaliação para efeito de progressão nas carreiras, que consideraram desadequada. Hoje é a chamada «Prova de Avaliação», que consideram inadmissível e mal feita. Amanhã sabe-se lá o que será. Como seria de esperar, a Federação Nacional de Professores (Fenprof), principal agremiação sindical da classe, reagiu à pretensão do Governo de criar a tal «Prova de Avaliação» dizendo tratar-se de um expediente «ilegal», e tratou logo de entregar providências cautelares em meia dúzia de tribunais. E porquê ilegal? Porque o incontornável líder da Fenprof considera que os professores já estão habilitados «tanto no plano científico como profissional», pelo que a prova põe em causa «o direito ao exercício da profissão». Temos, portanto, que o Estado tem a obrigação de dar emprego aos professores porque os professores têm esse direito. E a todos os professores, porque segundo Mário Nogueira todos estão habilitados para isso. Seguindo este admirável princípio, se houver cem candidatos habilitados a preencher duas vagas numa determinada empresa, a empresa deverá admitir os cem, ou os dois que julgar melhores? Segundo o senso comum, deverá admitir os dois que julgar melhores. Segundo a lógica de Nogueira, deverá admitir os cem. Há muito se percebeu que o ideal, para os professores e respectivos sindicatos, seria que os ditos terminassem as licenciaturas e ingressassem automaticamente no ensino público, e uma vez lá cuidassem das suas próprias avaliações e do mais que lhes conviesse — coisa, de certa maneira, que tem vindo a suceder, embora já tivesse sido pior. Será preciso dizer que as exigências dos professores do ensino público e dos sindicatos que os representam atingiram as raias do absurdo?
ISTO É IMPERDÍVEL.

18 de dezembro de 2013

PROFESSORES (2). Certamente com a pressa de fazer o exercício quinzenal de «tiro ao Crato», que vem fazendo ao actual ministro da Educação mesmo ainda antes de tomar posse, o professor Santana Castilho escreveu a seguinte barbaridade no Público de hoje: «não há professores de primeira e professores de segunda, mas, tão-só, professores». Como é evidente, há professores de primeira e de segunda, médicos de primeira e de segunda, carpinteiros de primeira e de segunda, futebolistas de primeira e de segunda. Dito de outra maneira, há profissionais melhores do que outros. É isso, aliás, o que o actual ministro pretende fazer: escolher os melhores, dispensar os restantes. O processo terá algumas falhas, mas a ideia parece-me justa.
PROFESSORES (1). Sobre os professores do ensino público, só gostava que me alguém me respondesse a três perguntinhas. Quais foram as medidas tomadas pelo Governo (qualquer Governo) com as quais concordaram? Qual foi a proposta de avaliação das suas competência que acharam adequada? Qual foi o ministro da Educação que consideraram sério, competente, e que tenha proposto alguma coisa com pés e cabeça? Que me lembre, todas as medidas tomadas ou propostas foram medíocres, todos os ministros foram maus, todos os governos foram péssimos. Ora, é normal que todos os Governos só tenham feito asneiras, que todos os ministros da Educação tenham sido incompetentes, que tudo esteja errado? Há aqui qualquer coisa que não bate certo, não é?

17 de dezembro de 2013

RESPONDA QUEM SOUBER. O Tribunal Constitucional é a última instância em matéria constitucional. Havendo dúvidas quanto à constitucionalidade de uma lei, ou parte dela, a ele cabe decidir se entra, ou não, em vigor. Decisão que uma vez tomada será irrevogável (não à maneira de Portas), e que poderá, também, ser inconstitucional. Ou não?

16 de dezembro de 2013

NATAL DOS HOSPITAIS. Como diria uma respeitável senhora, agora ao serviço da Pátria, o Natal dos Hospitais é um daqueles inolvidáveis momentos que consegue a proeza de juntar «a fina flor do entulho». A gente olha para os «artistas» que lá passam, ouve as dúzias de lugares-comuns e o paleio de circunstância dos convidados — e nos casos mais benevolentes apetece correr para a casa de banho, nos piores puxar de pistola. Num país onde tem vindo a aumentar o consumo de antidepressivos, talvez não fosse má ideia acabar com a solidariedade empacotada, a alegria postiça, a mercadoria fora de prazo. Aquilo é visto por consideráveis milhões? Também os bestsellers vendem milhões, e nem por isso passam a valer o papel em que foram impressos.

12 de dezembro de 2013

OS RESULTADOS ESTÃO À VISTA. Apesar de ser demasiado confusa, há uma passagem claríssima na prosa de Raquel Varela, que o Público identifica como investigadora e historiadora do trabalho: a função da Universidade não é adaptar-se «ao que o mercado necessita». «O mercado», diz ela, «é que tem de vir com urgência à universidade para ser criticado», que a universidade é o «lugar onde se produz conhecimento, onde se questiona o óbvio, onde se desafia, com coragem, o senso comum» (eu avisei que a prosa é confusa). Resumindo, deve ser o mercado a adaptar-se ao que as universidades pretendem, não as universidades «ao que o mercado necessita». Assim se percebe melhor por que nos últimos anos milhares de jovens obtiveram canudos que não servem para nada.
ANA, A GENEROSA. Confesso que já tinha saudades das calinadas da eurodeputada Ana Gomes. Tem «vergonha» da «falta de generosidade» de Portugal para acolher refugiados sírios? E que tal começar por praticar a generosidade lá em casa, acolhendo uns quantos?

11 de dezembro de 2013

NADIR AFONSO, 1920-2013.

 
 Procissão em Veneza

9 de dezembro de 2013

COISAS QUE TORNAM O MUNDO MELHOR. Passei parte do fim-de-semana com O Leopardo, e outra parte a ler o terceiro volume do «Quarteto Bandini» (Pergunta ao Pó). De Lampedusa pouco mais conhecia que a célebre frase «tudo deve mudar para que tudo fique como está» (a frase varia consoante as traduções), mas a uma centena de páginas do final atrevo-me a dizer que foi do melhor que já li. De Fante, só há dias soube da sua existência, e se já vou no terceiro volume quer dizer alguma coisa. Fante terá sido o principal inspirador de Kerouac e Bukowski, e Bukowski terá mesmo dito que Fante foi, para ele, «um deus». Lido há anos quase todo o Kerouac e algum Bukowski recentemente, a sensação com que fico é que Fante foi, de longe, melhor que os melhores «discípulos».

6 de dezembro de 2013

COMEDOUROS. Almoço num restaurante onde o proprietário cumprimenta os clientes um a um, conhecidos e desconhecidos, que ele parte invariavelmente do princípio que todos os clientes gostam de ser cumprimentados pelo proprietário. Como não bastasse, raramente se fica pelo passou bem. Entabula conversa de circunstância quer os clientes queiram, quer não, ri-se alarvemente com a graça que julga ter, balbucia em vernáculo a propósito e a despropósito com os clientes mais chegados mas sempre audível para os restantes, e se os clientes lhe são desconhecidos trata logo de saber quem são, o que fazem, e onde penduram o pote. A primeira vez que lá fui cumprimentou-me com parcimónia, quis saber o que eu achava da comida, e passou adiante. Três clientes depois voltou atrás, pôs-me a manápula no ombro, e perguntou-me o que eu fazia. Satisfeita a curiosidade, voltou à vida dele, mas não por muito tempo. Regressou para que lhe desculpasse a curiosidade, que ele era assim mesmo, que não o levasse a mal. Ou talvez fosse outro o motivo, que o sujeito pode ser burro mas parvo é que não é.

4 de dezembro de 2013

COISAS INADMISSÍVEIS. É, de facto, inconcebível uma greve dos juízes, como diz o bastonário dos Advogados, por mais que nenhuma lei o impeça, e por mais que discorde de Marinho Pinto em variadíssimas matérias. Como me parecem inconcebíveis greves das forças policiais (PSP, GNR, PJ) ou das Forças Armadas, e inadmissíveis manifestações — de que a última, de várias forças policiais, terminou da forma que se sabe. Há sectores da sociedade que pura e simplesmente deveriam ser impedidos de ter sindicatos, de fazer greve e/ou se manifestarem. Dir-me-ão que juízes e polícias são cidadãos como os outros, com direitos e deveres como os outros. Segundo a lei, assim é. Na prática, espera-se de juízes e polícias que estejam à altura das funções que desempenham, e convenhamos que fazer greve ou manifestações são actividades que não se compadecem com as funções que desempenham. Podem, profissionalmente, ganhar alguma coisa com isso, mas perdem o respeito dos cidadãos — e abrem a porta a práticas ainda mais graves.

2 de dezembro de 2013

HÁ MALES QUE VÊM POR BEM. Numa prosa por vezes analfabeta (leiam e verão que não exagero), o escritor Valter Hugo Mãe diz estarem em perigo os livros extensos quando o livro for apenas digital — que passarão, segundo ele, a ser produzidos de modo a irem «ao encontro da especificação rigorosa dos assuntos e da falta de paciência do leitor». Mas nem tudo será mau caso a profecia se cumpra, digo eu. Por exemplo, a prosa de Mãe ganharia muitíssimo caso fosse reduzida a um parágrafo, de preferência não muito extenso.