31 de março de 2006
«Um estudo divertido», diz quem tenta impedir a venda de um livro onde se arrasa completamente a obra de Margarida Rebelo Pinto™. Confesso que a mim me parece tudo, menos um estudo divertido. Diria mais: o livro que João Pedro George se prepara para dar à estampa é um autêntico linchamento, embora um linchamento com base em factos, carradas de factos. Pelo menos a versão a que tive acesso, a que foi publicada no Esplanar e que parece ter sido a base para o livro. Mas não é isso o que aqui me traz. Nem isso, nem, sequer, a tentativa de silenciar a obra, tão estouvada quanto grotesca. O que me faz espécie é o pormenor da notícia em que se diz que as vendas dos livros de Margarida Rebelo Pinto™ sofreram uma enorme queda após a publicação do texto no blogue e a notícia do 24 Horas. É que, a ser verdade, isto significa que os críticos literários têm mais poder do que se diz. Claro que a notícia do 24 Horas ajudou muito, e duvido que o texto em causa tivesse chegado aos leitores de margaridas caso não fosse o 24 Horas. Mas é preciso dizer que o texto de João Pedro George chegou lá porque continha a substância de que são feitas as notícias: os factos, coisa rara de se ver numa crítica literária e que, por si só, fazem toda a diferença.
30 de março de 2006
Freitas do Amaral, outra vez. Agora por causa de uma conferência de imprensa na sede do Ministério dos Negócios Estrangeiros canadiano em que recusou participar por ter sido vedada à imprensa portuguesa, que posteriormente considerou «um pequeno acidente de percurso». Desconhece-se, à hora a que escrevo, mais pormenores sobre o caso, nomeadamente as razões invocadas para impedir o acesso aos jornalistas portugueses. Mas uma coisa é certa: independentemente das razões que lhe poderão assistir, Freitas do Amaral agiu com pouca diplomacia. É preciso não esquecer que o ministro dos Negócios Estrangeiros se deslocou ao Canadá para defender os interesses dos portugueses que lá se encontram em situação ilegal, pelo que seria de esperar todos os cuidados diplomáticos e um pouco mais de humildade. Cuidados que também não foram muitos quando Freitas do Amaral resolveu afirmar, antes da partida para o Canadá, que lhe parecia ter havido algum excesso de zelo no processo de deportação dos portugueses. Mas há mais: pouco depois do incidente da conferência de imprensa, o ministro dos Negócios Estrangeiros resolveu advertir o Governo canadiano para o «grave prejuízo para a economia do Canadá» caso «os trabalhadores portugueses [do sector da construção civil] começassem todos a ser mandados embora». Isto é, Freitas do Amaral resolveu dar lições de economia ao Governo canadiano. E depois ainda me acusam de ter um problema com Freitas do Amaral.
«(…) os responsáveis políticos cedem muitas vezes à tentação de procurar melhorar a "segurança colectiva" através da restrição das liberdades individuais», diz Bettencourt Resendes no DN de hoje. Ora, eu gostava de saber como é possível melhorar a segurança colectiva sem abrir mão das liberdades individuais. Estou a falar a sério, porque ainda não vi uma única alma explicar, com exemplos concretos, como isso se faz.
29 de março de 2006
Ainda não vi a tropa do costume tecer o mais leve comentário sobre o muçulmano convertido ao cristianismo que se viu obrigado a pedir asilo político no estrangeiro (no caso a Itália) por correr sérios riscos de ser condenado à morte no seu país (o Afeganistão). Pelos vistos, para essa gente isto é assunto sem importância. Imaginem o barulho que por aí não iria caso fosse a igreja católica a condenar uma ovelha tresmalhada a um castigo dez vezes inferior ao que paira sobre o afegão. Não, já disse que sou ateu, e não tenho razões para defender a igreja católica. Mas seria bom que não se metesse tudo no mesmo saco, que se enfrentassem as coisas tal como são.
28 de março de 2006
27 de março de 2006
24 de março de 2006
Sobre a polémica em curso por causa do iTunes, quero dizer o seguinte: recuso-me a comprar um produto (música, vídeo, o que for) que não possa usar onde me apetecer. Isto é, que não possa usar em qualquer outro leitor de ficheiros digitais ou computador que não tenha o iTunes instalado. Independentemente das razões que possam assistir à indústria, parece-me óbvio que o consumidor ganharia com a adopção de um formato que pudesse ser lido por qualquer maquineta. E se o consumidor ganharia, também me parece óbvio que a indústria ganharia. Mais: contrariamente ao que diz a indústria, esta medida contribuiria para a diminuição da pirataria e não para o seu incremento.
23 de março de 2006
Renato Carmo defende o aparecimento de «uma esquerda de vanguarda». E que «esquerda de vanguarda» seria essa? Segundo ele, uma esquerda que questione «a fundo o papel do Estado na sociedade» e não receie «apontar os seus excessos», uma esquerda que encare a globalização «como uma oportunidade de solidariedade e de criatividade», uma esquerda que perceba que «o indivíduo é o centro de qualquer acção política», uma esquerda que encare «a liberdade individual como um valor supremo». Uma esquerda, enfim, mais próxima da direita.
22 de março de 2006
Não, não tenho nada de pessoal contra Freitas do Amaral. Nem de pessoal, nem de político, muito menos político-partidário. Mas as notícias que diariamente me chegam da sua actividade como ministro dos Negócios Estrangeiros são de tal modo desconcertantes que não conseguem passar despercebidas, sobretudo quando são trapalhadas que sucedem a trapalhadas. O ainda ministro dos Negócios Estrangeiros decidiu, agora, não despedir quem já tinha despedido, porque hoje concluiu que necessitava de quem ainda ontem não fazia falta. No caso, o conselheiro cultural em Pequim, após ter descoberto que aquele funcionário era o único que falava mandarim e cantonês na Embaixada de Portugal na China. Bem sei que isto passaria facilmente despercebido caso Freitas do Amaral não tivesse um currículo invejável em matéria de trapalhadas. Mas, como tem, a coisa tende a ser vista como mais uma trapalhada — que, na realidade, é. Quantas mais trapalhadas serão necessárias para que Freitas do Amaral se dedique a outra actividade?
21 de março de 2006
20 de março de 2006
O recente episódio protagonizado por Freitas do Amaral e pelo seu homólogo dinamarquês — em que o primeiro terá pedido ao segundo que falasse à imprensa portuguesa no sentido de esclarecer o episódio dos cartoons e que acabou com Freitas do Amaral a meter, de novo, o pé na argola, como conta a revista Sábado — chega a ser hilariante. E ainda dizem que o ministro dos Negócios Estrangeiros está a ser vítima de perseguição ou má-fé por causa de águas passadas, como se as razões por que é criticado não valessem por si.
17 de março de 2006
A notícia de que hospitais e clínicas privadas portugueses estarão em condições de receber ingleses que se encontram à espera de uma cirurgia (o Público fala em 150 mil) quando é sabido que em Portugal existem 242 mil desgraçados na mesma situação, só pode ser uma anedota de mau gosto. A gente só fica realmente a saber que a coisa é a sério depois de ouvir o presidente da Associação Portuguesa de Hospitalização Privada dizer, ao Público, que isto das cirurgias aos ingleses pode ser uma boa notícia para o turismo português, ao mesmo tempo que atribui a espera dos portugueses (oito meses em média) a problemas «administrativos». Mas há mais dados curiosos revelados por Teófilo Leite: «os privados fazem cerca de 100 mil cirurgias por ano e não teriam problemas em assegurar mais cerca de 50 mil». Sim, parece que há um expediente que permite aos utentes portugueses do sector público fazer cirurgias nos privados a expensas do Estado em casos excepcionais, embora a coisa também tenha os seus problemas administrativos. Num cartoon publicado na Sábado da semana passada, Luís Afonso procurava saber junto de um cidadão finlandês «como é possível sobreviver num país [a Finlândia] onde há muita produtividade e não há iliteracia nem corrupção». O cartoon deixa a resposta no ar. Mas, pelo sim, pelo não, desaconselha-se a emigração portuguesa para a Finlândia.
Sou ex-fumador mas sou contra esta decisão, absolutamente contra. Aliás, sobre este assunto sou profundamente anti-americano.
Recomendo ao J. Rentes de Carvalho três livros de viagens que não são livros de viagens: Porto-Sudão, de Olivier Rolin, O Céu que nos Protege, de Paul Bowles, e Debaixo do Vulcão, de Malcolm Lowry. (Se é que já não leu, evidentemente.)
16 de março de 2006
O primeiro-ministro presidiu à sessão de encerramento de um encontro destinado a promover a introdução das novas tecnologias nas pequenas e médias empresas. Até aqui, tudo normal. Acontece que a coisa se chamou «Webização da Comunidade Empresarial do Comércio», uma macaquice perfeitamente escusada e que não lembra ao diabo.
15 de março de 2006
Faz tempo que as primeiras páginas de um livro me fascinaram como estão a fascinar-me as primeiras páginas de Modigliani: A Life (de Jeffrey Meyers), a biografia de um pintor italiano que eu, além do nome, pouco mais conhecia. O fascínio deve-se à forma como está escrita, pois do conteúdo ainda é cedo para falar. Espero ter a mesma sorte com as minhas últimas aquisições, também elas biografias: Miles Davis: The Definitive Biography, de Ian Carr, Mozart: A Life, e Beethoven, ambas de Maynard Solomon.
13 de março de 2006
Não há dia que passe sem que um político importante nos venha dizer que é possível resolver o problema do Irão pela via diplomática. Não há dia que passe que não se torne mais evidente que é cada vez mais remota essa possibilidade. Não há dia que passe que não se torne mais claro que o trabalho sujo vai sobrar para os americanos.
10 de março de 2006
O ministro dos Negócios Estrangeiros considerou «ignorantes» os que não «perceberam» o conteúdo do comunicado que sua excelência resolveu emitir para condenar a publicação dos cartoons sobre o profeta Maomé. Temos, assim, que eu sou ignorante, porque também eu «não compreendi» o que ele disse sobre tão douta matéria. Nada que me rale por aí além e que eu, no fundo, não seja, mas confesso que ainda me ralaria menos se Freitas do Amaral fosse ministro do Burundi. Como ele julga que está certo e que os que dele discordaram são uma cambada de estúpidos (ou mal-intencionados, ou ignorantes), teme-se que a cegueira do ministro seja maior da que se costuma atribuir ao pior cego. É que a cegueira de Freitas do Amaral é bem capaz de ser uma variante da ignorância, no caso uma variante para pior. E quando a ignorância se junta à arrogância, mais vale nada a dizer.
9 de março de 2006
«O português nunca pode ser homem de ideias, por causa da paixão da forma. A sua mania é fazer belas frases, ver-lhes o brilho, sentir-lhes a música. Se for necessário falsear a ideia, deixá-la incompleta, exagerá-la, para a frase ganhar em beleza, o desgraçado não hesita... Vá-se pela água abaixo o pensamento, mas salve-se a bela frase.» Eça de Queirós, Os Maias
8 de março de 2006
Pode ser muito bem intencionado, mas o projecto que pretende impor uma quota mínima para as mulheres nas listas para eleições legislativas, autárquicas e europeias — a chamada Lei da Paridade — é um disparate completo. Por que razão as mulheres hão-de entrar na política por decreto e não por vocação ou competência? Não será isto um insulto às mulheres?
7 de março de 2006
6 de março de 2006
Esta senhora deu voz a milhões de pessoas que pensam como ela mas não têm voz — ou, então, preferem refugiar-se no politicamente correcto. Pode ser que isto seja um começo. Pode ser que se comece a discutir o Islão com rigor e frontalidade.
2 de março de 2006
Era só o que faltava que o sagrado não pudesse ser posto em questão, como defende o cardeal-patriarca de Lisboa. O sagrado pode (e deve) ser questionado por qualquer criatura pensante, a sério ou a brincar, por crentes e não crentes. Mas se não surpreende a posição de D. José Policarpo, o desempenho do ministro dos Negócios Estrangeiros não se compreende. Depois de ter feito asneira atrás de asneira (asneira é o mínimo que se pode dizer), Freitas do Amaral disse, agora, que condenar a violência por causa dos cartoons «não era o essencial». O essencial, para ele, é «não deitar mais achas para a fogueira», e a melhor maneira de promover a paz e a concórdia é condenar uma parte e esquecer a outra. Esquecer é como quem diz, que o problema de Freitas do Amaral não foi o esquecimento. O problema é ele achar que a violência por causa dos cartoons é compreensível (logo desculpável), e que o acto de os publicar só pode ser condenável. Isso é que é lamentável.
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