29 de julho de 2004
27 de julho de 2004
Três mulheres ao meu lado põem as notícias em dia. Diz uma que, lá em casa, passa a vida ao telefone. O marido até já lhe disse que se ele tivesse um telefone entre as pernas era o homem mais feliz do mundo. Depois riem-se alarvemente. A do telefone chama agora um empregado para lhe comunicar que acabou de dizer às amigas que ele tem uns olhos bonitos. O empregado, coitado, não sabe onde se meter. E elas voltam a rir-se alarvemente. Dizia Eça que as mulheres são «pessoas excelentes, que têm a doçura de fingir que não têm espírito — só para não humilharem os maridos!». «E são ternas?», perguntaram-lhe. Ao que ele respondeu: «Aprenderam a ternura de cor — mas recitam-na mal.»
26 de julho de 2004
23 de julho de 2004
22 de julho de 2004
Tal como Pacheco Pereira, Manuel Alegre faz parte de um reduzido número de pessoas que, na política, pensa pela própria cabeça, e de um número ainda mais reduzido de pessoas que diz alto e bom som o que pensa — mesmo que isso vá contra o que pensa o seu próprio partido. Daí que me custe ver Manuel Alegre candidatar-se a secretário-geral do PS, um cargo para o qual não me parece que tenha qualquer vocação. Além de ser uma surpresa, provavelmente só comparável à surpresa que foi a candidatura de Vasco Pulido Valente a um lugar no Parlamento.
Francisco José Viegas no seu melhor: «Quando o Estado se mete a ser moderno, dá asneira. O Estado é uma personagem vetusta, com cabeleira postiça, anterior à penicilina e que escreve em resmas de papel almaço - quando se veste de boca-de-sino e lycra, a tremer ao som do hip-hop, parece uma velha gaiteira, inadequada para ser apresentável entre gente decente. Digamos que, em meu entender, deve conservar uma certa pose, a de quem não faz aeróbica nem vai a Vilar de Mouros acampar entre pulgas e lagartixas participando em cerimónias rituais para fumar haxixe.»
«Não inviabilizar» não é o mesmo que «viabilizar», diz Ana Gomes. Se não percebem a diferença, leiam este post. Se continuarem a não perceber, desistam.
21 de julho de 2004
«Caminhávamos pelos passadiços arruinados, de mão dada. Uma ligeira brisa fazia esquecer por um momento a fornalha. Eu sentava-me, ela agachava-se, juntava as mãos esguias sob o queixo, eu tirava uma harmónica do bolso e tocava, era a única ocasião em que uma expressão de alegria infantil surgia no seu rosto (mesmo no amor, porque acontecia mesmo assim que o fizéssemos, ela mantinha uma máscara impassível), olhávamos as aves deslizando no céu incandescente, ou então víamos vogar as velas irisadas dessas medusas a que os ingleses chamam "barcos de guerra portugueses", e cujos longos filamentos purpurinos e azuis podem causar a morte. Tomar-nos-iam por loucos, ou por fantasmas. Sentíamo-nos bem, um e outro, imagino, casal caminhando na água profunda e triste, porque o mundo parecia de repente afastado.» (Porto-Sudão, Olivier Rolin)
20 de julho de 2004
Parece que um conselheiro de segurança do presidente Clinton terá desviado documentos secretos que deveriam ser apresentados à comissão que investiga o 11 de Setembro. Repito: parece, porque a investigação continua. «Devolvi tudo o que tinha, à excepção de alguns documentos que deitei fora acidentalmente», disse Sandy Berger, admitindo que o fez «inadvertidamente». Reparem no «acidentalmente» e no «inadvertidamente». É que entre os documentos que foram deitados fora «acidentalmente» e «inadvertidamente» constam rascunhos de um relatório sobre a forma como a administração Clinton lidou com as ameaças feitas pela Al-Qaeda aquando das celebrações do Milénio, em Dezembro de 1999. Coisas sem importância, portanto, a ponto de se deitaram fora «acidentalmente» ou «inadvertidamente». Como também não terá importância o facto de Sandy Berger ser um dos conselheiros de John Kerry, candidato democrata às eleições presidenciais de Novembro. Pensarão que eu vejo esta notícia com grande regozijo. Não é verdade. E não é verdade por uma razão muito simples: estou farto de saber que a mentira não é exclusivo de uma das partes, apesar de nos quererem fazer crer que assim é. Curiosamente, ou talvez não, horas depois desta notícia estar em todo o lado, na BBC e no portal Terra nem sombra dela. Assim vai a imprensa «independente».
19 de julho de 2004
Depois de ter decidido dar nova oportunidade ao PSD em vez de convocar eleições antecipadas, o Presidente Sampaio passou a fazer tudo mal. Agora é a Lei de Bases da Educação (que vetou), amanhã será outra coisa qualquer. Também já se sabe que Santana Lopes não vai beneficiar do «estado de graça» de que costumam gozar os chefes do governo nos primeiros meses — nem, sequer, do benefício da dúvida, como ficou claro à medida que foram conhecidos os novos ministros. A política — a pequena política — continua em brasa, e adivinha-se que mais tempo. Resta saber se o país ganha alguma coisa com isso.
16 de julho de 2004
Tirando a crónica de João Bénard da Costa, que cada vez me dá mais gozo ler, nada que mereça o mais leve comentário.
15 de julho de 2004
14 de julho de 2004
O juiz que integrava o colectivo dos casos de pedofilia da Casa Pia pediu uma licença sem vencimento de longa duração, diz a Lusa. O novo juiz titular do processo «Apito Dourado» «é filho de um assessor de Valentim Loureiro e irmão de um fiscal de obras da Câmara Municipal de Gondomar», diz o DN, embora já desmentido por não sei quem. Sim, as coisas nem sempre são o que parecem. Mas convinha que não se lançassem ainda mais dúvidas sobre quem já há dúvidas que chegue.
13 de julho de 2004
Até prova em contrário, a ideia de transferir ministérios da capital para a Província é um perfeito disparate. Um perfeito disparate porque isso não deixará de acarretar custos, e não se vêem vantagens. Que benefícios terá um agricultor transmontano com a transferência do Ministério da Agricultura para Santarém? Que benefícios terá um empresário algarvio com o Ministério da Economia na cidade do Porto? De facto, não se percebe. Mas já se percebe a ideia enquanto tal, mesmo que se revele impraticável. Afinal, ela dá um ar de que se pretende descentralizar, e ideias destas sempre rendem uns minutos de televisão e uns títulos nos jornais. Além de que, como dizia o outro, em política, o que parece é.
12 de julho de 2004
9 de julho de 2004
Independentemente de se gostar mais desta ou doutra solução, é evidente que a única decisão sensata que podia ter sido tomado pelo Presidente da República face à actual crise política foi a decisão que tomou. Sensata e legítima porque a Constituição não deixa dúvidas quanto ao caminho a seguir, já não se podendo dizer o mesmo caso o presidente optasse por dissolver o Parlamento e convocasse eleições antecipadas. Não se compreende, pois, a «tempestade política» que tal decisão provocou, tanto mais que a hipótese de o PSD ser convidado a formar novo Governo foi sempre um cenário plausível. E ainda menos compreensível que o líder do PS se tenha demitido alegando uma «derrota pessoal», apesar de ter pelo PR uma «amizade de muitos anos». Pior só quando os jornalistas agem como se fossem funcionários políticos, como bem demonstrou Carlos Magno com uma arrogância e sobranceria impressionantes.
8 de julho de 2004
Eu não gosto de Alberto João Jardim. Já o disse variadíssimas vezes e por razões que expliquei. Mas não há dúvida de que ele tem razão quando diz que não há uma crise política, mas «uma instabilidade» que dura há duas semanas «por causa de alguém não gostar de outro alguém». Também nunca simpatizei com Pedro Santana Lopes, mas não convence ninguém quem diz que Pedro Santana Lopes não tem legitimidade para suceder a Durão Barroso sem que, para isso, haja eleições (no PSD ou no país). Evidentemente que toda a gente sabe qual é o verdadeiro problema: certa direita não gosta de Santana Lopes, e a esquerda quer eleições porque está convencida que as ganha. O resto é pequena política. Ou ainda mais pequena política.
Pacheco Pereira fez um retrato do português-médio que merece um caixilho. Francisco José Viegas disse umas coisas sobre Santana Lopes em que vale a pena meditar.
7 de julho de 2004
Todos os livros que emprestei até hoje fiquei sem eles. Todos — não me lembro de qualquer excepção. E fiquei sem eles por uma razão muito simples: não mos devolveram, e esqueci-me a quem os tinha emprestado. Mas, um dia, decidi cortar o mal pela raiz e não mais emprestar livros fosse a quem fosse. Não foi uma decisão fácil e custou-me várias incompreensões e inúmeros equívocos, mas nunca me arrependi de o ter feito. Cheguei, inclusive, a comprar livros para oferecer a quem mos pedia emprestados só para não ter que emprestar os meus, pois eu sabia que ia ficar sem eles. Foi mais ou menos isto o que, hoje, tentei explicar a um amigo meu que me pediu um livro emprestado, mas não me pareceu ter ficado lá muito convencido. É normal. Afinal, só quem já passou por elas ou atribui importância aos livros enquanto objectos (como é o meu caso) compreende o alcance do que estou a dizer.
5 de julho de 2004
Almoço num restaurante português. Como seria de esperar, o Portugal-Grécia domina as conversas. E todas as conversas giram à volta do mesmo: a derrota de Portugal. A derrota de Portugal que está a ser difícil de digerir, e para a qual é preciso encontrar bodes expiatórios. Scolari errou. Deco não jogou merda nenhuna. O árbitro foi um filho da puta. Portugal é o maior? Pois era.
2 de julho de 2004
A Hora da Partida
A hora da partida soa quando
Escurecem o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.
A hora da partida soa quando
As árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.
Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.
Sophia de Mello Breyner Andresen
A hora da partida soa quando
Escurecem o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.
A hora da partida soa quando
As árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.
Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.
Sophia de Mello Breyner Andresen
1 de julho de 2004
Pedro Santana Lopes foi eleito presidente do PSD pela esmagadora maioria dos votos (98 contra 3). O actual presidente da Câmara de Lisboa sucede, assim, a Durão Barroso no cargo de presidente dos social-democratas — e poderá, em breve, tornar-se primeiro-ministro. Tudo isto em meia dúzia de dias e, aparentemente, de acordo com as regras. Mas há uma ideia que fica desta nomeação: por mais legítima que tenha sido — e nada indica o contrário —, fica a ideia de uma vitória na secretaria, e as vitórias na secretaria não se recomendam. Já os «golpes de Estado» invocados pela dra. Manuela Ferreira Leite e pelo dr. Alberto João Jardim, embora por razões distintas, são um manifesto exagero.
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