30 de maio de 2012
COISAS ÓBVIAS. Admitindo no Parlamento a existência de um encontro de trabalho com o ex-espião Silva Carvalho que ainda ontem, no mesmo Parlamento, diz não ter tido, o ministro Miguel Relvas assumiu inequivocamente que mentiu. Como em casos passados, não estamos diante meras suspeitas ou no domínio das interpretações, mas diante factos indesmentíveis. Aliás, o próprio ministro admitiu a omissão, e de certa maneira penitenciou-se por ela. Só há, portanto, duas saídas possíveis para um membro do Governo que mentiu ao Parlamento e se demonstra que mentiu: pela porta da frente, ou pela porta de trás.
29 de maio de 2012
CINEMA PORTUGUÊS. Eu sei que o cinema português é um assunto demasiado complexo para ser tratado com a ligeireza de um post, e ao que vejo sou dos poucos que não tem uma opinião definitiva sobre o apoio do Estado à produção cinematográfica. Mas, a avaliar pela quantidade de notícias que periodicamente nos chegam, temos, em Portugal, um cinema pujantíssimo, e mundialmente premiadíssimo. Só há um pequeno senão: tirando a fauna directa ou indirectamente ligada aos meios, ninguém vê o cinema português. O facto é, por si só, extraordinário, já que os prémios significam publicidade, e presume-se que a publicidade levará o público a vê-lo. Por razões que me escapam, não é assim. De extraordinário só os milhões que o Estado despende com o cinema português, e quando se diz Estado diz-se os contribuintes. Sim, eu sei que este é o argumento mais controverso, e geralmente é atribuído às más-línguas. As más-línguas que em tempos o cineasta João César Monteiro desejou que se f.
25 de maio de 2012
EUROFESTIVAL DAS CANTIGAS. Depois dos Homens da Luta, que no ano passado causaram um escândalo em certos meios artísticos por alegadamente terem imposto uma canção de carregar pelo bico a músicas de alto gabarito (a propósito: por onde andarão elas?), este ano foi a vez da «talentosa Filipa Sousa» (foi assim que a RTP a anunciou) representar a pátria no eurofestival das cantigas. O desinspirado adjectivo com que a RTP se referiu à cantante não augurava nada de bom, embora não me pareça que tenha sido por isso que ficou afastada das dez finalistas. Por aquilo que ouvi, a cançoneta é tão medíocre como as outras, apuradas e rejeitadas. Aliás, continuo sem perceber por que insistem as televisões no eurofestival das cantigas. Alguém se lembra da canção que venceu o ano passado? Evidentemente que ninguém se lembra. Há décadas que as cançonetas do eurofestival são tão sofríveis que não duram uma semana nas rádios. Como em arte o tempo é o grande juiz, será preciso dizer mais?
RECEITA PARA O DESASTRE. Como a previsão da OCDE acaba de demonstrar (antevê a necessidade de Portugal adoptar ainda mais medidas de austeridade para atingir os objectivos a que se propôs), a receita do Governo para a crise está a matar o doente. O primeiro responsável pela receita é o Governo, evidentemente, e ainda com responsabilidade acrescida por ter ido além do que a troika recomendava. Mas não deixa de ser espantoso que a receita para sair da crise, o famoso Memorando de Entendimento, que na altura em que foi aprovado ninguém contestou (salvo a esquerda do costume, pelas razões do costume), tenha sido cozinhada por quem nunca se duvidou da sua competência — a famosa troika, constituída pelo Fundo Monetário Internacional, Banco Central Europeu e Comissão Europeia, que ontem foi ao Parlamento dizer que tudo vai bem e noutro sítio qualquer se mostrou surpreendida com a subida do desemprego. Como mais uma vez se demonstra, o mundo está cheio de especialistas que erram no mais básico, pelo menos na economia e na política. É por isso que quando ouço um político ou economista fazerem previsões de curto ou médio prazo geralmente não dou a mais leve importância. Nas previsões de longo prazo, prefiro as bruxas e demais confraria. É que eles ao menos divertem-me, e se calhar até são assertivos.
23 de maio de 2012
SOBRE O VENTO QUE PASSA. Concordo, na generalidade, com Paulo Pinto Mascarenhas quando ele diz que o «caso Miguel Relvas» tem, pelo menos, um mérito: «subitamente, descobriram-se insuspeitos defensores da liberdade de imprensa que se mantiveram calados durante os últimos seis anos». Há, porém, uma coisa que não disse e que também é verdade: os insuspeitos defensores da liberdade dos últimos seis anos estão, hoje, calados. Como o Paulo muito bem sabe, isto da liberdade de imprensa tem dias, e varia consoante a direcção do vento.
22 de maio de 2012
PERGUNTAS QUE GOSTARIA DE VER RESPONDIDAS. Onde é que já se viu um ministro ameaçar uma jornalista com a revelação de assuntos da sua vida privada caso a jornalista publicasse determinada notícia e a coisa acabar num mero pedido de desculpas? E, já agora, que informações serão essas que o ministro terá na sua posse e como as obteve? Mandou espiar a jornalista? E por que terá pedido desculpa ao jornal e à jornalista se pouco antes desmentiu «categoricamente qualquer tipo de ameaça»? Depois há a cada vez maior irritação de Miguel Relvas com as notícias sobre o «caso das secretas» que o dão próximo de Silva Carvalho, o ex-espião que o Ministério Público acusou de seis crimes. O ministro começou por dizer que nada tinha com o ex-director do SIED, depois admitiu ter recebido uns SMS a que não terá dado importância, e a seguir, à medida que mais factos vierem a lume, adivinha-se que fará uns acrescentos. Também o Público não ficou bem na fotografia. As explicações foram trapalhonas, e deixaram mais perguntas que respostas. Não publicou determinada notícia por nada acrescentar ao que já tinha dito, ou por pressão do ministro? Por que só admitiu as pressões do ministro quando o Conselho de Redacção decidiu pôr a boca no trombone? Que factos tão comprometedores haverá sobre a vida pessoal da jornalista Maria José Oliveira que a possam inibir de exercer a profissão como mandam as regras? Convinha que o Público explicasse o que realmente se passou, e que assumisse os erros caso os tenha cometido. Quanto ao ministro Miguel Relvas, evidentemente que deixará de ter condições para se manter no Governo caso se confirme a chantagem sobre a jornalista.
21 de maio de 2012
PREGAR NO DESERTO (1). Há anos que Paulo Morais denuncia a corrupção, e de um modo que faz toda a diferença: aponta casos concretos, explica as trafulhices de modo a que todos entendam, e nalguns casos diz mesmo quem são os vigaristas. Fornece, em resumo, matéria bastante para que as autoridades possam agir, e agindo ser bem-sucedidas. Como é sabido, em vão. As autoridades não agem, se agem acabam a discutir a quem compete fazer o quê, ou então deixam, por incompetência ou incapacidade (quando não as duas coisas), que os processos se arrastem até à prescrição — e salvo raríssimos casos os resultados são nulos. Pior: a corrupção tornou-se de tal modo corriqueira que já ninguém se indigna. São tantos os casos conhecidos e os que se adivinham que a generalidade dos detentores de cargos políticos, sobretudo autárquicos, facilmente se torna, aos olhos dos cidadãos, suspeitos até prova em contrário. Isto para só falar da corrupção pura e dura, da que facilmente pode ser demonstrada, que a mais sofisticada é mais difícil de provar — e praticamente impossível de punir. E quando a corrupção pura e dura permanece impune, mais vale nem pensar na outra.
17 de maio de 2012
SERIA BOM ESCLARECER ISTO. A Grécia não poderá, em caso de incumprimento, ser expulsa da Zona Euro. Porque na Zona Euro «há um silêncio total sobre a possibilidade de saída dos Estados», e porque o Tratado de Lisboa «só prevê a possibilidade de saída voluntária dos países da UE, nunca a sua expulsão». Eis, em resumo, o que diz Viriato Soromenho Marques na sua crónica de hoje.
16 de maio de 2012
VERGONHOSO. Sempre achei que a morte não melhora quem nunca foi bom, e custa-me engolir elogios aos defuntos de quem ainda ontem, vivinhos da silva, se dizia o piorio. Mas chegar a ponto de fazer a triste figura que os deputados do PSD madeirense fizeram, com o chefe à cabeça, vai um abismo. Os srs. deputados têm razões para não apreciar Miguel Portas? Não as conheço, mas suspeito que têm. Mas abandonar o hemiciclo aquando de um voto de pesar pela sua morte, curiosamente proposto pela mesma «família política», convenhamos que soa péssimo. Estou à vontade para dizer o que digo: discordei quase sempre do que Miguel defendia. Mas não misturo alhos com bugalhos. Uma coisa são as ideias, que possamos considerar disparatadas (ou mesmo perigosas); outra são as convicções e a dignidade de quem as defende. E os deputados madeirenses, ao não respeitarem a dignidade alheia, foram indignos do cargo que desempenham.
14 de maio de 2012
INCOMPETENTES. Já aqui manifestei algumas dúvidas acerca da competência da Judiciária, então a propósito de irregularidades (nalguns casos crimes) praticadas por agentes (ou ex-agentes) daquela polícia. Agora é a vez das secretas porem a nu toda a sua incompetência. Então os agentes desconhecem que os e-mails e as mensagens electrónicas enviadas e recebidas podem, em caso de suspeita de irregularidades, ser usados para os incriminar? Pelos vistos, desconhecem. E se assim é, não sei o que é mais assustador: se a prática dos crimes de que alguns são acusados, se a colossal incompetência que demonstraram.
9 de maio de 2012
COISAS DIVINAS. Conta-se que Morgan Yetman, então um dos proprietários da firma Taylor, Fladgate & Yetman, se deslocou a Londres para um exame médico de rotina e o clínico que o observou, surpreendido com a saúde do paciente apesar da idade avançada, resolveu inquiri-lo acerca dos seus hábitos diários. Quis saber, por exemplo, se o sr. Yetman bebia vinho, e se bebia que tipo de vinho. Ao que o sr. Yetman prontamente respondeu: «Obviamente, Porto!» O clínico quis saber que quantidade, e o sr. Yetman não se fez rogado: «Uma pipa por ano.» Ora, uma pipa são 550 litros, litro e meio por dia. Nada do outro mundo, segundo alguns comentaram na época, e a verdade é que ali estava um quase ancião a comprová-lo. O rótulo que ilustra este texto pertence a um certo vinho fino (é assim que se chama na minha terra) que também tem uma história, mas a verdade é que já não me lembro dela. Mas já não me esquecerei tão depressa que foi do melhor que eu já bebi (tive ocasião de o comprovar durante meia dúzia de garrafas), de pedir meças a um Porto apenas reservado às visitas ilustres (desculpem a imodéstia) que em tempos provei numa adega com vista para o Tua. Bendito seja, portanto, quem fez tal vinho, bendito seja quem mo deu. É que nem sempre os melhores vinhos vão parar aos estômagos de quem sabe apreciá-los, desculpem a presunção.
7 de maio de 2012
DISPARATES INESPERADOS. Com certeza que as grandes cadeias de comércio alimentar têm poder financeiro para suportar a nova taxa aprovada pelo Governo, como disse a ministra da Agricultura, para quem a mega promoção do Pingo Doce foi prova disso. De facto, basta-lhes subir os preços dos produtos que comercializam e o assunto fica resolvido. Só tem um pequeno senão que a ministra talvez não tenha pensado: a conta vai sobrar para os consumidores. Aliás, a ministra distingue-se por pensar pouco, e mal. Face à polémica do Pingo Doce, Assunção Cristas prometeu novas leis destinadas a impedir «promoções inesperadas». E que leis são essas que tenciona propor? Infelizmente, não entrou em detalhes. Mas adivinha-se que vem aí disparate.
CASOS DE POLÍCIA. Não simpatizo com Black Fridays, Boxing Days e mega promoções do Pingo Doce, mas a verdade é que não vislumbro motivo para tanto barulho. A coisa podia ter sido noutro dia? Podia, mas noutro dia não teria o impacto que teve, e a publicidade (gratuita) que teve. Mas se não simpatizo com estas práticas e com o timing escolhido, ainda simpatizo menos com quem diz que a jogada da Jerónimo Martins foi uma «promoção aviltante que manchou o 1.º de Maio», «um aliciamento à pobreza que atinge milhões de portugueses», e que «ao consumidor faz bem uns dias de pousio» (Miguel Gaspar, Público). Ou que foi «um marketing da miséria», «uma bomba de neutrões», «o circo romano», um mero exercício destinado a «acicatar a voragem desumana» (Pedro Santos Guerreiro, Jornal de Negócios). Houve prática de dumping na operação do Pingo Doce? Muito haveria a dizer sobre dumping (não me lembro de quem reclamasse esta prática em casos idênticos), mas se é verdade que a lei não foi cumprida o caso é simples de resolver: chamem a polícia, façam-nos pagar as multas que a lei prevê para estes casos, e se for caso disso ponham-nos em tribunal. Não venham é dizer que as promoções do Pingo Doce são um caso de política, como disseram alguns governantes e um sem número de deputados, uns por mera ignorância, outros por claro oportunismo.
O DEDO NA FERIDA. «A revolta desta esquerda não é contra os capitalistas ou a Jerónimo Martins, é contra o povo que pura e simplesmente não é o que eles queriam que fosse.» (Pedro Marques Lopes, DN) «Para a esquerda, o povo só vale a pena quando está do lado "certo". No lado "errado", o povo é um caso perdido e, conforme alguns comunistas de facções diversas não se eximiram de confessar no 1.º de Maio, assaz repugnante. (...) Apesar do apego à santidade da data, a esquerda não gosta de trabalhadores reais: gosta de moços de recados, que em democracia derrubariam as prateleiras cheias dos supermercados e num regime perfeito percorreriam ordeiramente as prateleiras vazias, de senha de racionamento na mão.» (Alberto Gonçalves, DN)
4 de maio de 2012
LIBERDADE DE IMPRENSA. Parece que ontem foi dia da liberdade de imprensa, ocasião que um grupo «para o desenvolvimento da denominada literacia mediática» aproveitou para reflectir a importância dos media no dia-a-dia. A ideia foi pôr as pessoas a reflectir sobre o que está de tal modo entranhado no quotidiano que já ninguém questiona, disse um dos seus responsáveis, e contou com uma série de actividades espalhadas pelo país destinadas a encontrar uma resposta à magna questão: «Que significado têm os media na nossa vida e como poderiam tornar-se mais significativos?» Ora, mesmo sabendo que já não vou a tempo de introduzir um novo tópico na reflexão, gostaria de ver discutidos alguns factos recentemente divulgados pelo Expresso. Segundo o jornal, os angolanos detêm 96,6% do Sol, 15,08% da Cofina (Correio da Manhã e Sábado, entre outros), 2% da Impresa (Expresso e SIC, entre outros), estão interessados num canal da RTP, e correm rumores de que pretendem adquirir 20% da Globalnotícias (Diário de Notícias, Jornal de Notícias e TSF, entre outros). Gostaria, portanto, de ver discutido o crescente controlo dos media portugueses por capitais estrangeiros, e as consequências, suponho que pouco agradáveis, que a circunstância não deixará de ter na soberania que nos resta.
3 de maio de 2012
ZOMBIES, DIZ ELE. Talvez isto seja a constatação, ainda que involuntária, de que os grandes educadores do povo falharam, afinal, na educação do povo.
2 de maio de 2012
IMPORTAM-SE DE RESPONDER? Se os McCann pretendem que o processo relativo ao desaparecimento da sua filha seja reaberto quando foram os culpados pela sua morte, como então disse o inspector da Judiciária que conduziu a investigação e logo depois voltou a dizê-lo num livro que procurou demonstrá-lo, o que pretenderão os McCann? O que terá a dizer o ex-inspector Moita Flores, que no Correio da Manhã se fartou de denunciar o que então jurou ser uma conspiração do governo inglês destinado a descredibilizar tudo o que não apontasse para a tese do rapto, e depois, mal surgiram notícias que não abonavam a sua tese, se calou muito caladinho? Seria interessante saber o que acharão eles sobre a atitude dos pais, que nos explicassem que interesse terão os McCann em desenterrar um caso de que são, segundo as sumidades, os principais suspeitos.
1 de maio de 2012
DO PROVINCIANISMO. Quem me lê sabe que não tenho grande simpatia pelo Presidente Cavaco. Mas saberá, também, que não hesito em sair em defesa de quem vejo acusado de forma injusta, seja ele quem for. Há um reparo que fazem ao Presidente que não aprecio especialmente: dizer-se que Cavaco é da província, no caso de Boliqueime, sem que se vislumbre outro propósito que não seja apoucá-lo. Vasco Pulido Valente é dos que mais recorre a este expediente, e a última crónica do Público é só mais um exemplo. Que necessidade terá ele de usar a origem social do PR? Quererá dizer que Cavaco não pertence à casta certa? Se é, e tudo indica que é, que o diga com frontalidade. Porque se há outra coisa que também me irrita são as meias palavras, os subentendidos, as insinuações — que neste particular talvez produzam o efeito contrário do que pretendem.
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