30 de janeiro de 2009
CAMPANHA NEGRA. «A menos que haja informações ocultas, se existe uma campanha negra [contra o primeiro-ministro] pode-se desde já indicar suspeitos pela sua origem: a Procuradoria-Geral da República, que desenterrou o processo, e a Serious Fraud Office, que fez as perguntas sobre José Sócrates.» Manuel Carvalho, Público de hoje
29 de janeiro de 2009
JORNAL DE LETRAS. Bem sei que o período não é apropriado (comemora-se a milésima edição), mas apetece-me dizer que faz sete anos que deixei de comprar o Jornal de Letras. Digo mais: por falta de espaço, desfiz-me, há muito, do arquivo (que transportei de Portugal para a América e, na América, da primeira para a segunda residência), excepto dois exemplares onde publiquei umas coisas sem importância. Como calcularão, não foi uma decisão fácil (refiro-me ao arquivo), mas nunca me arrependi. Pelas razões que apontei, mas, também, porque me fartei de jornalismo de capelinha. Fartei-me de ver promovidos escritores e artistas cujo único mérito era o passado antifascista, fartei-me de ver silenciado quem era bom por não ter esse passado. Desde então para cá, numa mais vi um exemplar (é praticamente impossível encontrar o JL onde resido). Pode ser, portanto, que tenha mudado. Mas era assim.
FUGAS DE INFORMAÇÃO. Ouvi, de raspão, a magistrada Cândida Almeida dizer, à RTP, que vai instaurar um inquérito para apurar a origem das fugas de informação referentes a não sei que processo, e apeteceu-me logo perguntar: quantas vezes já ouvimos esta história? Conhece-se o desfecho de outros inquéritos também prometidos? Terão sido feitos? Terão sido encontrados (e punidos) os responsáveis pelas fugas de informação? Que se saiba, nada se fez, nada se apurou, e nada se disse.
28 de janeiro de 2009
DA LIBERDADE. Como seria de esperar, as declarações do cardeal-patriarca de Lisboa a propósito do casamento entre cristãos e muçulmanos deram azo a reacções da malta do costume, pelas razões do costume. (Continuação aqui.)
27 de janeiro de 2009
HUMOR NEGRO. O procurador-geral da República disse, hoje, que a investigação criminal é feita «sem olhar a quem», que «todos são iguais perante a lei», e que «nada justifica que alguém seja especialmente visado só por ocupar lugar de relevo». Até aqui, nada de extraordinário. O extraordinário é a gente ler isto sem se rir.
DO PENSAMENTO ÚNICO. Mário Soares escreveu que um comentador «se atreveu a criticar o discurso» de Obama, que o terá considerado «banal». Espera-se, agora, depois de Soares ter feito a denúncia, que o sujeito seja exemplarmente punido.
26 de janeiro de 2009
LIBERDADE DE EXPRESSÃO. Esta história do deputado holandês ser julgado por ter incitado, através de comentários à comunicação social, «ao ódio e à discriminação das suas crenças», bem como por ter feito um filme onde o Islão é descrito como um culto violento, só pode estar mal contada. É que, a ser verdade, estamos diante um grave atentado à liberdade de expressão. Goste-se ou não do sujeito (eu não gosto), parece-me que ele tem o direito de pensar como pensa, e de exprimir o que pensa da forma como o tem feito. Que o politicamente correcto nos queira impor as suas regras, compreende-se. Mas que os tribunais se rendam a essa pretensão, é preocupante. Pior: o caso não mereceu a condenação de ninguém. Fosse um islamita a dizer que os católicos deviam ser espingardeados por não pensarem como ele e alguém responder-lhe ameaçando-o com um par de tabefes, e a esta hora já se tinham publicado resmas de prosa a defender a liberdade de expressão do sujeito.
23 de janeiro de 2009
ESPÍRITO CRÍTICO, PRECISA-SE. Como lembrou o Pedro Lomba, o espírito crítico desapareceu em parte incerta. Diria mais: parece que a quadra festiva que a posse de Obama originou anestesiou tudo e todos. Se bem me lembro, Guantánamo começou por ser uma prisão a fechar imediatamente. Já presidente-eleito, os assessores apressaram-se a anunciar que seriam precisos cem dias. Agora, depois de tomar posse, o prazo já passou para um ano. Perante isto, não se vê a mais leve crítica — nem, sequer, dos que nunca viram Obama como o Sol da Terra. Espantoso, não há dúvida. (Ver, já agora, esta notícia, a que cheguei via O Insurgente.)
22 de janeiro de 2009
21 de janeiro de 2009
FARTO. Terminada a entronização (ouvi quem lhe chamasse canonização), chegou a hora de Obama mostrar o que vale. Como disse e repeti, estou longe de partilhar o entusiasmo da grande maioria dos que nele votaram. Lembro-me do discurso de ontem, é um facto. Mas ainda me lembro melhor da costela de vaca que comi a seguir ao discurso, que essa foi simplesmente divina. A comparação é um bocado grosseira, eu sei. É que eu estou farto de retórica, e o folclore nunca me entusiasmou.
POUCA VERGONHA. Ora aí está: a culpa, segundo Ferreira Diniz, é dos miúdos, que decidiram prostituir-se a troco de dinheiro. Aqui chegados, já nada surpreende no processo Casa Pia. Surpresa será se alguém for condenado por práticas pedófilas, e quando digo alguém não me refiro ao ex-motorista Carlos Silvino, que esse pagará pelos crimes que terá cometido, e ainda pelo crime maior de não ter a capacidade de se defender que têm os restantes arguidos. Note-se que não estou a dizer que Ferreira Diniz é culpado, que todos são inocentes até prova em contrário. Falo do caso em geral, que águas passadas indiciam que vai acabar em nada. Em nada, evidentemente, para os prevaricadores, que as vítimas correm o risco de serem vítimas de novo.
19 de janeiro de 2009
GAFES. É fácil e barato atacar os jornalistas quando os jornalistas não fazem o que achamos que deviam, ou quando fazem o que achamos que não deviam. É fácil porque os jornalistas quase nunca se defendem, e é barato porque casos destes só raramente acabam nos tribunais. Mas, sendo fácil e barato, já não me parece que o expediente seja eficaz, especialmente quando são os políticos a queixarem-se. Qual foi a Oposição que não se queixou dos media controlados pelo Estado? Qual foi o Governo que não se queixou dos media que considerou hostis? Que me lembre, todos os governos e todas as oposições se queixaram. Não pretendo tirar razão a quem a tem, ou dizer que é inútil criticar os jornalistas — nem, muito menos, dizer que os jornalistas não têm, por vezes, culpas no cartório. Pretendo, apenas, dizer que já todos vimos este filme demasiadas vezes, e a um filme visto demasiadas vezes dá-se pouca ou nenhuma importância. Fez mal, portanto, Manuela Ferreira Leite em acusar a Lusa de ter sido instrumentalizada pelo Governo no caso do TGV. Pelas razões que apontei, mas também porque os argumentos invocados por Manuela não me convenceram. Razão terão os que, no PSD, disseram que estamos diante de «mais uma das suas gafes», embora me pareça que o caso é bem mais grave do que isso.
15 de janeiro de 2009
MENEZES. Nunca dei um tostão por Menezes como líder do PSD, e o tempo foi-me dando razão. Mas lembro-me de o ver crucificado ainda antes de dar os primeiros passos, e não gostei do que vi. Não que não houvesse legitimidade para o criticar, mesmo acabado de sair de um congresso que o elegeu e sem tempo ainda de mostrar o que valia. Não gostei porque Menezes não mereceu o benefício da dúvida a que todos têm direito, pois já era mau antes de o ser. Concedo que as declarações diárias de Menezes após abandonar a liderança são um manifesto exagero e em grande parte motivadas pelo ressentimento. Mas eu estou mais interessado nos argumentos que ele usa para disparar sobre a actual direcção, e convenhamos que são bem mais contundentes que os argumentos contra si utilizados quando era líder dos sociais-democratas. Não fosse a boa imprensa de que goza Manuela Ferreira Leite, ao contrário do que alguns querem fazer crer, e teríamos uma contestação à actual liderança que Menezes nunca teve.
14 de janeiro de 2009
ALDRABÕES. Lembro-me de Vital Moreira fazer, num Prós e Contras, o seguinte aparte quando esgrimia argumentos com não sei quem a propósito de não sei quê: «Sejamos sérios.» Como segui de perto o que o cavalheiro foi publicando sobre a intervenção militar no Iraque e o conflito israelo-palestiniano, o aparte provocou-me um sorriso. Por razões idênticas à que ontem foi dada à estampa no Público: «Porque [sic] é que as operações militares contra os palestinianos se saldam sempre pela destruição de infra-estruturas básicas, incluindo edifícios escolares e sanitários, pela morte de tantas pessoas sem nenhuma responsabilidade nos combates, por impiedosos desastres humanitários?», pergunta o professor. A pergunta destina-se, evidentemente, a «demonstrar» que Israel não pretende, com a incursão militar em Gaza, liquidar o Hamas mas o povo palestiniano, uma insinuação largamente utilizada por quem não se distingue pela frontalidade. Quem, apesar das aldrabices que diariamente nos chegam de Gaza disfarçadas de «relatos imparciais» e dos opinantes que não se inibem de recorrer à mentira para impor os seus pontos de vista, não sabe que o Hamas usa escolas e bairros como bases de operações militares? Assim sendo, como proceder à destruição dos seus recursos militares sem causar vítimas inocentes? Evidentemente que não é possível, como bem sabe Vital Moreira. Não é possível, nem desejável, que as vítimas inocentes são, para o Hamas, tão necessárias como o pão para a boca, como Vital Moreira também sabe. Mas de factos não lhe convém falar, porque os factos lhe estragam a sua bela teoria. Pois é graças a quem pensa como ele que o conflito israelo-palestiniano está no ponto em que está.
13 de janeiro de 2009
UMA NO CRAVO, OUTRA NA FERRADURA. O Daniel Oliveira começou desta maneira a sua crónica no último Expresso: «De 2001 até ao começo desta incursão punitiva em Gaza, morreram, vítimas dos rockets do Hamas, 23 israelitas. No mesmo período foram mortos pelos israelitas mais de 2000 civis palestinos de Gaza. Esta contabilidade macabra não diz quem tem razão neste conflito. Mostra apenas a razão porque [sic] a paz tem sido impossível no Médio Oriente. A assimetria de força militar e política é, pelo menos desde 1973, absoluta.» Como se vê, o Daniel admite que a desproporção de mortos não diz quem tem razão, uma evidência que, vinda de quem vem, me surpreendeu. Mas, depois, retomou a «normalidade». E a «normalidade», para ele, é dizer que a paz tem sido impossível devido à desproporção de meios militares, como se o argumento não fosse tão falacioso como seria dizer-se que a desproporção de mortes demonstra quem tem razão. Isto de ter ideias e não ter argumentos para as sustentar é uma chatice.
A CARTA. O problema não é Margarida Moreira ter escrito uma carta com os pés. O problema é que talvez não estejamos perante um caso isolado — ou, sequer, uma excepção.
12 de janeiro de 2009
GUANTÁNAMO. Votei Obama por razões que então expliquei, entre elas por estar convencido de que Obama se renderia ao pragmatismo mal chegasse a hora de tomar decisões. Como acabamos de ver no caso de Guantánamo, em que o presidente-eleito admitiu adiar a sua extinção por cem dias, o pragmatismo falou mais alto. É certo e sabido que uma coisa é o que se deseja, outra aquilo que é. E aquilo que é tem, no caso, muita força. Isto, claro, para não dizer que Obama devia estar melhor informado quando garantiu, em campanha, que ia acabar com Guantánamo mal fosse eleito, e naturalmente partindo do princípio que se trata de informação deficiente — embora isso não invalide que se possa dizer, desde já, que Obama quebrou uma promessa de campanha. Foi a primeira vez que o fez (façamos de conta que a equipa governamental por si constituída marcou a tal rotura com o «sistema» que prometeu), mas não será a última.
RACIOCÍNIOS. Ora aqui está mais um «raciocínio brilhante» sobre o conflito israelo-palestiniano: «Estamos a assistir a um combate de David (os palestinianos com os seus roquetes, armas ligeiras e fundas com pedras...) contra Golias (os israelitas com os seus mísseis teleguiados, aviões, tanques e se necessário... a arma atómica!)», diz Fernando Nobre. A coisa, segundo ele, é simples: tem razão, no conflito israelo-palestiniano, quem menos capacidade tem para se defender (ou atacar). E quem não pensa dessa maneira, acrescenta, é «ignorante». Vale a pena lembrar que Fernando Nobre é presidente da AMI (Assistência Médica Internacional), uma organização que tenho por estimável — e ao serviço da qual diz ter participado «em mais de duzentas missões de estudo, coordenação e assistência médica humanitária em cerca de sessenta países de todos os continentes». É que me custa a crer que um homem com tão larga experiência de vida não seja capaz de um raciocínio mais elaborado, e que se refira ao Hamas como um movimento de «resistentes».
9 de janeiro de 2009
SONDAGEM. A popularidade do Hamas junto dos palestinianos andava, pelos vistos, pelas ruas da amargura. Nada, portanto, como uma guerra para aumentar a popularidade de quem está no poder. Não é isto o que se costuma dizer nestes casos? Ou a tese apenas se aplica quando nos convém?
ESMERALDA. Cada vez se percebem menos os contornos do «caso Esmeralda», mas cada vez se tornam mais evidentes duas coisas: a criança vale pouco, e a Justiça não fez o que lhe competia. Pior: a Justiça passou o tempo a fazer o que não devia, e quando fez o que devia não foi em tempo útil. Salvo melhor opinião, todos são vítimas: a pequena Esmeralda, os pais biológicos, e os pais adoptivos. Pode ser que me engane, mas este caso ainda vai acabar pior.
7 de janeiro de 2009
PACIFISTAS. Lembram-se do autarca que ameaçava puxar de pistola caso alguém lhe falasse de cultura? Pois apetece-me fazer o mesmo quando ouço falar de pacifistas. (Continuem a ler aqui.)
6 de janeiro de 2009
RIDÍCULO. Vítor Malheiros comparou a invasão da Faixa de Gaza pela tropa israelita a uma hipotética invasão, pelas polícias portuguesas, do Bairro da Cova da Burra. A pretexto de que o local se transformou num covil de meliantes, e que os meliantes «saíam de vez em quando para atacar e roubar os pacatos cidadãos dos bairros limítrofes» em operações que, às vezes, resultavam em mortes, o jornalista do Público, procurando traçar um paralelismo entre a Cova da Burra (belo nome) e a Faixa de Gaza, disparou: seria legítimo que as forças policiais lançassem uma gigantesca rusga e que a operação se saldasse em «500 mortos, entre os quais várias famílias inteiras e dezenas de crianças»? Temos, pois, que Vítor Malheiros é ingénuo, não conhece a natureza do conflito israelo-palestiniano, pretende tomar-nos por parvos, ou está a ser intelectualmente desonesto. Admito, como hipótese meramente académica, que o jornalista colocou a questão nestes termos de forma a simplificar e a fazer com que todos percebam o que está em causa, mas o que está em causa não é, evidentemente, tão simples — nem o exemplo da Cova da Burra serve, obviamente, de comparação. O Hamas é um bando de malfeitores que sai «de vez em quando para atacar e roubar os pacatos cidadãos dos bairros limítrofes»? O Hamas, sr. Malheiros, não é, de modo algum, o que nos quer fazer crer. O Hamas é uma organização que pretende varrer Israel do mapa, e foi o próprio Hamas quem o disse. Isto devia chegar e sobrar para não se meter a comparar o que não é comparável, e a poupar-nos a um exercício, no mínimo, ridículo.
VÍTIMAS. Amos Oz dizia, há pouco, o seguinte: «Os cálculos do Hamas são simples, cínicos e pérfidos: se morrerem israelitas inocentes, isso é bom; se morrerem palestinianos inocentes, é ainda melhor.» Para que o desejo dos mandarins da Faixa de Gaza se torne realidade, vale, portanto, tudo. E tudo inclui usar escolas como bases de operações de guerrilha, como hoje se confirmou, pois o Hamas pretende que a reacção israelita a ataques desta natureza provoque vítimas inocentes. Quem viu os vídeos do Hamas que por aí circulam, a começar por este, sabe bem do que o Hamas é capaz. Usar alvos civis como bases para lançar operações de guerrilha, bem como os seus próprios concidadãos como escudos humanos, tornou-se, há muito, rotina, e à rotina ninguém dá importância. Importância só quando os sujeitos exibem as vítimas de ataques como os de hoje como quem exibe troféus, pois eles sabem que as vítimas alimentam os «pacifistas» e outros malabaristas. Vítimas, recorde-se, que nada fizeram para evitar. Como disse Amos Oz, quanto mais vítimas, melhor.
5 de janeiro de 2009
BORGES. Já vos falei deste alfarrabista, que então caracterizei como uma espécie de Strand sem novidades. Mas caracterizei mal, como descobri posteriormente. O Montclair Book Center tem o dobro do tamanho que eu julgava, e é bem capaz de ser maior que a livraria nova-iorquina em livros usados. Conversations with Jorge Luis Borges, de Richard Burgin (edição de 1968), foi a mais recente preciosidade que lá comprei.
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