31 de maio de 2013

BOLA. Presumo que as televisões, pelo menos as privadas, dão aos clientes o que eles querem ver. Goste-se, ou não, do que lhes é oferecido. Também acho excessivo que se abra o Jornal da Tarde da RTP com o rescaldo da Taça de Portugal, como ainda há pouco sucedeu, e como não chegasse a coisa prolongou-se por intermináveis minutos. Mas se neste caso falamos da televisão pública, mais questionável que as outras, há pouco a dizer sobre as privadas. Devo dizer, já agora, que geralmente me incomodam mais os comentários anti-bola que os excessos da dita. Já repararam que os anti-bola são tão ou mais insuportáveis como os fanáticos da bola? Nalguns casos, piores, que os segundos pelo menos são genuínos, e os primeiros nunca se sabe.

30 de maio de 2013

FUGIR AO PROBLEMA. Os impostos não cobrados sobre o dinheiro escondido em paraísos fiscais daria para «acabar duas vezes com a pobreza extrema no mundo», dizia, há dias, uma organização não-governamental, segundo a qual há 14 biliões de euros escondidos, dois terços dos quais na União Europeia, de que anualmente resulta uma perda de 120 mil milhões de euros em receita fiscal. Somando a isto os impostos que nem precisam dos paraísos fiscais para não ser pagos, ou pagos na totalidade, é obscena a quantidade de dinheiro que circula apenas em benefício de uns poucos e em prejuízo dos restantes. É preciso acabar com isto, disse a União Europeia pela enésima vez, mas a realidade é que nem a uma lista de países que promovem essas práticas consegue chegar. E porquê? Porque alguns países que integram a União Europeia beneficiam com os paraísos fiscais, Portugal incluído. Temos, assim, que a União está interessada em resolver o problema, mas não está interessada em resolver problema nenhum. Como diria o outro, tudo como dantes, quartel-general em Abrantes.
UNION SQUARE, NY.



29 de maio de 2013

A MEDIOCRIDADE QUE NOS GOVERNA. Viram o vídeo onde um eurodeputado se insurge contra quem, na sua opinião, não tem legitimidade para mandar na Europa? Se viram, hão-de ter reparado em Durão Barroso a fingir que procura não sei o quê durante todo o discurso, e quando o dito termina também ele dá por finda a inadiável procura. Devo dizer que o presidente da Comissão Europeia nunca foi da minha simpatia, e esbanjou o escasso respeito que lhe tinha quando trocou o cargo de primeiro-ministro por mais interessantes pastagens. Mas nunca pensei que se tornasse um símbolo dos políticos que há, da União Europeia que temos — uma coisa cada vez mais artificial, cada vez menos democrática, cada vez mais distante dos cidadãos. Durão Barroso é o mais rematado exemplo da mediocridade que nos governa.

24 de maio de 2013

PALHAÇADAS. Chamar «palhaço» ao Presidente da República é, de facto, excessivo, e ao que parece punível por lei. Fez bem, portanto, Miguel Sousa Tavares admitir que se excedeu, provavelmente mais por temer o processo que aí vem que por arrependimento, digamos, genuíno. É que Sousa Tavares já tentou contextualizar o que disse, isto é, dividir com terceiros (entrevistadora e/ou editores do Jornal de Negócios) a culpa do sucedido. Também não aprecio o actual Presidente, sobretudo a partir da palhaçada das escutas que admitiu ter sido alvo por parte do anterior Governo, que rapidamente se percebeu terem sido inventadas pelos seus colaboradores, com, ou sem, o seu conhecimento. Mas chegar onde chegou Sousa Tavares, é inadmissível. Adivinha-se que o processo, a haver, acabará por questionar a natureza do que foi dito. Afinal, há sempre a possibilidade de «palhaço» não ser ofensivo, pois sabemos que «palhaço» também pode ser uma actividade respeitável — e os tribunais funcionam como se sabe. Surpreende-me, por isso, que Sousa Tavares já tenha admitido um erro que juridicamente ainda está por demonstrar que cometeu.

22 de maio de 2013

UMA NO CRAVO, OUTRA NA FERRADURA. Os ex-ministros das Finanças ora são os responsáveis pela ruína do país, ora são as respeitadas figuras que é preciso ouvir com toda a atenção. Quando dá jeito, fala-se deles com nostalgia e veneração; quando não dá, apanham todos pela medida grande. Não há pachorra para as opiniões que variam de manhã para a tarde, consoante faz chuva ou faz sol. Falo dos espaços de comentário que nos últimos anos tomaram conta das televisões. Umas vezes devido à ignorância dos comentadores, outras devido às agendas dos intervenientes, frequentemente devido às duas coisas.

17 de maio de 2013

NÃO VOU COMENTAR. Sempre que um governante — ou dirigente político — é confrontado pelos jornalistas com perguntas incómodas, geralmente acaba a dizer: «Não vou comentar.» Os mais expeditos não só não respondem como aproveitam a ocasião/tempo de antena para dizer o que lhes convém, e sempre que tal acontece os jornalistas metem o rabinho entre as pernas e divulgam o que só aos políticos interessa. Ora, os jornalistas deviam pôr fim a isto. Os políticos não respondem ao que lhe perguntam? Então não há notícia — ou a notícia será a pergunta que o político recusou responder, acrescentada das possíveis razões para a recusa. Veriam que o silêncio não seria boa ideia.
O ABORTO ORTOGRÁFICO. Aprovada coadoção por casais homossexuais (Diário de Notícias). Co-adoção por casais do mesmo sexo foi aprovada (Correio da Manhã). Parlamento aprova co-adopção por casais homossexuais (Público).

15 de maio de 2013

DÉJÀ VUE. Conheço Carlos Abreu Amorim da blogosfera, onde publicou variadíssimos textos com os quais quase sempre estive de acordo. (O comentário político na TV que veio a seguir à blogosfera praticamente não vi.) Foi, por isso, sem surpresa que o vi candidato a deputado, e ser eleito. A surpresa viria depois. Como chegou ele tão rapidamente a vice-presidente da bancada parlamentar social-democrata? Não tendo, que me conste, qualquer experiência partidária antes de ser deputado, a que se deveu o milagre? Vejo-o agora, na condição de candidato à Câmara de Gaia, pedir o afastamento do ministro das Finanças, porque «o tempo político de Vítor Gaspar terminou», e «o país precisa de uma nova etapa». Independência de espírito de Abreu Amorim? Honestamente, duvido. O candidato à Câmara de Gaia já percebeu que é preciso descolar rapidamente do «patinho feio» do Governo de Passos Coelho para agradar aos potenciais eleitores, e em nome disso vale tudo e o seu contrário. Como alguém já escreveu, Abreu Amorim é novo na política, mas aprendeu depressa o pior que ela tem.

10 de maio de 2013

CAMPEÃO DA CHICO-ESPERTICE. O treinador do FC Porto afirmou, há uma semana, que o Estoril não tinha hipóteses de conquistar pontos ao Benfica, insinuando que por aldrabices. No dia seguinte, a imprensa desportiva escreveu abundantemente: «Vítor Pereira atirou a toalha ao chão.» Dois ou três dias depois, o FC Porto ganhou ao Setúbal, e os jornais titularam: «Jogadores recusam-se a deitar toalha ao chão.» No dia a seguir o Benfica perdeu dois pontos frente ao Estoril, e no Dragão reacendeu-se o sonho do título. Acossado pelas críticas, e colocado perante a perda de pontos do Benfica (que lhe estragaram a teoria), o treinador do FC Porto corrigiu a pontaria dizendo que as palavras por ele proferidas se destinaram a exercer «pressão psicológica» sobre o adversário, estratégia cujo resultado (empate a um golo) lhe deu razão. Resumindo, Vítor Pereira resolveu fugir para a frente. Deve ser por estas e outras como estas que não será treinador do FC Porto na próxima época. Seja, ou não, campeão.
SER OU NÃO SER. É fácil, barato e muitíssimo popular dizer-se que determinado jornalista foi afastado de determinada redacção por ter feito algo que politicamente não agradou às chefias. De facto, não me lembro de um único caso em que um jornalista tenha sido despedido (ou demitido de um cargo) por incompetência, falta de profissionalismo, ou coisa que o valha. A fazer fé no que se tem dito, os despedimentos/afastamentos de jornalistas configuraram invariavelmente atentados à liberdade de expressão, actos de censura. Não sei se é o caso Ana Leal vs Judite de Sousa, de que só conheço o que saiu nos jornais. Convém, no entanto, não fazer juízos apressados, não julgar pelas aparências. Provavelmente nunca saberemos quem tem razão e não tem, se o caso traz água no bico ou não tem história. Mais uma razão, portanto, para não endeusar uns e demonizar outros. Prudência e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém.
JORNALISMO BARATO QUE SAI CARO. O jornalista X da publicação Y viajou a convite de Z. É isto o que dizem as publicações mais sérias (as outras omitem-no) sempre que se deslocam ao estrangeiro para fazer uma reportagem, cada vez com maior frequência, porque ficarão com um problema de consciência caso não o assumam. É bom, de facto, que os leitores conheçam as circunstâncias em que a reportagem foi feita sempre que as circunstâncias possam interferir no que se faz. Mas será preciso dizer que não há almoços grátis, que não se morde a mão de quem nos dá de comer? Constatar a evidência serve, de facto, de pouco consolo. Ainda agora li que o jornalismo de investigação praticamente morreu. Porque é caríssimo, e cada vez há menos dinheiro até para o mais básico. É um facto, nota-se bastante, e há muito. Mas nos tempos que correm já me contentaria se o jornalismo viajasse pelos seus próprios meios. Não investigar é preocupante, não há dúvida que é. Mas fazer fretes é inadmissível.

8 de maio de 2013

O MANICÓMIO. O primeiro-ministro anunciou ao país um «pacote» de austeridade, e dois dias depois o segundo ministro (há quem diga ser o terceiro) afirmou discordar. Confusos? Não é caso para tanto. Afinal, falamos de Portugal, país onde tudo acontece, inclusive fenómenos que nem a imaginação mais delirante se atreveria a prever. Quando o senso comum aconselharia que as medidas de austeridade anunciadas por Passos Coelho fossem primeiro discutidas — e aprovadas — no interior do Governo, eis que o dito vem à praça pública esgrimir discordâncias, ainda por cima quando acaba de eleger o consenso como supremo desígnio da pátria. Bem sei que há quem garanta que tudo isto não passou de uma tragicomédia, embora destinada não sei bem a quê. Mas como poderá a oposição chegar a um consenso com gente assim?

3 de maio de 2013

ARTE CONCEPTUAL. De um modo geral, não simpatizo com a arte dita conceptual, que as enciclopédias definem como a arte em que a ideia é mais importante que a obra. Quando muito reconheço-lhe utilidade (alertar para situações para as quais é importante alertar que doutro modo passariam despercebidas, por exemplo), e pouco mais. Tirando isso, o escasso mérito da dita é valorizar, por contraste, o que é bom. Estou, aliás, convencido de que a arte conceptual afasta mais gente da arte em geral que aproxima, alguns de forma irremediável. Serve, igualmente, para alguns desculparem (nalguns casos legitimarem) a ignorância ou desinteresse pela arte, aproveitando o que geralmente é um embuste para desvalorizar tudo o que não «entendem» e/ou não lhes interessa — para não falar dos artistas (com aspas ou seu aspas) conceptuais, cujo talento se resume a ter ideias (por vezes boas), à capacidade de chocar, e à autopromoção. Tirando excepções, a arte conceptual é um embuste destinado a impressionar os pategos, e a avaliar pela quantidade deles que se persignam à sua passagem é muito eficaz. Não sei se é o caso de Joana Vasconcelos, de que agora tanto se fala, cuja obra (com aspas ou sem aspas) conheço mal. Mas parece-me bem que se questione o que faz. Bem sei que a arte conceptual por vezes se situa entre a genialidade e o bluff, pelo que não é fácil distinguir uma coisa da outra. E sei, também, que a arte digna desse nome não é para todos, e não me venham com histórias da carochinha. Mas nada disso muda o essencial. E o essencial é que andam por aí demasiados gatos a ser vendidos por lebres, alguns com o beneplácito de sumidades (com aspas ou seu aspas) de vária ordem, que nos afiançam ser do melhor. Convém, por isso, questionar o que se faz, avaliar antes de consumir, degustar antes de engolir. Até para valorizar o que é realmente bom.
FRUTA DA ÉPOCA. Desculpem a frontalidade, mas sempre me pareceu que António José Seguro é uma anedota. Uma anedota que as notícias diariamente confirmam, e que já vem do tempo em que Seguro era oposição a Sócrates. A última de que há memória reza que Seguro está pronto para governar, mas quanto lhe perguntaram como tenciona resolver os problemas, respondeu que os resolva quem os criou (leia-se o Governo em funções). Resumindo, Seguro governa, os outros que resolvam os problemas. E acaba ele de ser reconduzido na chefia do PS pela maioria dos seus militantes, como se os seus militantes vissem nele o líder que manifestamente não é. Infelizmente, a oposição limitou-se a ir ao congresso assinar o ponto, sorrir para a fotografia, e continua a aguardar melhores dias. São os políticos que há.
CHOQUE E ESPANTO. Não faço a mínima ideia acerca da qualidade do romance Debaixo de Algum Céu, de Nuno Camarneiro, que o crítico António Guerreiro considerou «um amontoado de histórias» e uma «falácia metanarrativa» (ligação disponível só para assinantes). Também não sei se o livro anterior de Camarneiro (No Meu Peito não Cabem Pássaros) é bom ou mau, e não me espanta que o livro agora em análise tenha vencido a última edição do Prémio Leya. Espantoso é o Público dar uma estrela a um livro (a escala vai de 1 a 5), que o Público é todo estrelas quando aprecia autores portugueses. Mudou o critério, ou o livro é abaixo de cão?

2 de maio de 2013

COMENTADORES. Não sei se o comentário político nos media devia estar reservado, apenas, aos jornalistas, como defendem alguns. Mas já me parece excessiva a quantidade de políticos, no activo ou não, que proliferam por tudo o que é espaço de comentário. Não tenho dados que permitam demonstrá-lo, mas suspeito que os políticos geram audiências — telespectadores, ouvintes, leitores. Cai assim, portanto, a ideia sobre quem deve opinar sobre o quê, porque são as audiências que os desejam, e o cliente tem razão mesmo quando não tem. Claro que os políticos/comentadores têm as suas próprias agendas, exprimem opiniões mais em função dos seus próprios objectivos que por convicções pessoais (quando as têm), por vezes comentam questões em que são claramente parte interessada, e quem os ouve nem sempre sabe disso. Mas não tenhamos ilusões: também os jornalistas raramente podem dizer o que pensam. Por causa da agenda (alguns também têm), por causa do emprego, por causa de outros interesses ou impedimentos. Discordo, igualmente, da ideia de que há excesso de comentadores, sobretudo nas televisões, incluindo comentadores de que tudo parecem ser especialistas, a que alguém muito apropriadamente chamou «tudólogos». Discordo por uma razão: quanto mais comentadores houver, quanto mais espaço de comentário existir, melhor esclarecidos ficarão os cidadãos — a quem cabe, afinal, rejeitá-los se assim o desejarem. O problema de certo jornalismo é esquecer-se demasiadas vezes a quem se destina — aos telespectadores, aos ouvintes, aos leitores. «O comentário para ser credível deve ser feito por pessoas independentes e não por quem tem interesses directos ou indirectos na matéria que comenta», diz o provedor do telespectador da RTP, que publicamente discordou da «aquisição» de Sócrates pela RTP. Em teoria, faz todo o sentido. Na prática, tenho dúvidas. Quem são — e onde estão — os independentes? Quem não tem interesses directos, ou indirectos, nas matérias que comenta? Por acaso achará o provedor que os jornalistas poderão desempenhar cabalmente esse papel? Valerá a pena lembrar que o actual Governo recrutou uma dezena de jornalistas do DN? Foram lá parar graças a quê?